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MOTOR
Um dois e três zeros
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
Esta era para sair na virada do
ano. Por favor, imagine-se no primeiro dia de 2000.
Quando pequeno, ano 2000 era
algo longe, distante. A única certeza era fazer as contas e se projetar
em marco tão significativo.
Eu vou ter 34 anos, dizia, de um
modo neutro, como se 34 fosse
uma idade neutra, meio do caminho, essas bobagens.
Eu teria 34 anos. Estaria com
certeza vivo -creio que morrer
de verdade não faz parte do universo infantil-, gozando de boa
saúde, alguns quilos a mais, cigarros no bolso, casado, talvez filhos,
na verdade, nada muito diferente
do que acontece hoje.
ETs, discos voadores e uma vida
de jetsons não povoavam meus
sonhos. Muito menos estar sentado à frente de um computador ligado a um telefone e com os quais
falo, leio, escrevo, assisto, ouço,
enfim, cumpro boa parte das
ações de um cidadão dito moderno, de rotina intransitiva.
O futuro, esse com o qual sonhamos hoje, só virou realidade no
dia em que fui ao cinema assistir
a "Guerra nas Estrelas".
(Lembro de ficar uma sessão inteira sentado no chão da sala de
espera, lotada, em um tempo em
que ir ao cinema era atividade
um tanto quanto selvagem.)
No mais das vezes, minha geração foi sistematicamente enquadrada com aquilo que as reportagens descreviam como futuro
sombrio, da superpopulação, da
falta d'água, do fim das baleias.
Nessa linha, lembro de um filme
que passava muito na TV, com
Charlton Heston, no qual todos se
alimentavam de biscoitos e, no final, revela-se, os biscoitos eram
feitos a partir dos corpos das pessoas que iam morrendo, processados em uma grande fábrica triste
e escura, operada por robôs, um
roteiro Z, tétrico e genial.
Já entrei em uma linha de produção tocada apenas por robôs e
a sensação não é das melhores.
O ponto é que só tive tal sensação porque sabia o que era uma
fábrica cheia de operários. Assim
como sei o que é um carburador, o
que é uma alface. Dificilmente
minha filha saberá o que é o primeiro. E tenho dúvidas se meu neto saberá o que é o segundo.
Sim, o futuro é sombrio, mas
apenas para quem tem passado.
A F-1 involuiu no início desta
década em nome do piloto, do esporte e do espetáculo. Para muitos, manobra inócua e ou tímida.
Para outros, necessária.
O certo é que a F-1 atual é pinto
perto da que vivi quando garoto.
E que a geração que se prepara
para acompanhar Barrichello terá sensação semelhante quando
chegar à tal da idade neutra.
Somos efêmeros, dizem, esta é a
angústia. E chegar ao ano 2000
para contar a história, de repente,
parece muito pouco.
NOTAS
Subliminar
Rubens Barrichello aceitou
aparecer diante das câmeras
apanhando de um par de esquis, enquanto Michael Schumacher descia as montanhas
feito uma flecha na temporada
promocional de inverno da
Ferrari, na Itália. Como diz o
ditado, uma imagem vale mais
do que mil palavras, e Barrichello começa 2000 sendo rápido na pista, mas deixando
sua imagem à mercê dos maledicentes. Assim, óbvio, não dá.
Segunda fila
Capa da última "Autosport"
inglesa, a Jaguar já dá sinais de
que pretende ser a terceira força no Mundial 2000 da F-1.
Missão difícil para quem precisa rivalizar com a Jordan, anabolizada pela Honda e em fase
ascendente, e com a sempre
competente Williams, escoltada pela BMW. A briga promete
ser muito boa e será ainda melhor se, mais do que em 1999,
conseguir interferir na disputa
entre Ferrari e McLaren.
E-mail mariante@uol.com.br
José Henrique Mariante escreve aos sábados
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