São Paulo, sábado, 15 de junho de 2002

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JOSÉ GERALDO COUTO

Contradição entre defesa ataque está em cada um


Todo jogador brasileiro -exceto Emerson-tem vocação para cigarra. Só marca o adversário sob ameaça de tortura


Três vitórias, a melhor campanha da Copa até agora, média de quase quatro gols por jogo. Não resta dúvida de que a seleção embalou. Na partida contra a Costa Rica, já classificados, os jogadores se soltaram e praticaram um futebol alegre e ofensivo.
Beleza. Mas ainda é cedo para euforia. Não só porque o Brasil só enfrentou times fracos na primeira fase, mas porque continua apresentando as mesmas falhas e a mesma irregularidade.
Brasil x Costa Rica foi um jogo bonito porque os dois times "jogaram e deixaram jogar". O Brasil mostrou mais uma vez que tem um ataque poderoso e um sistema defensivo lastimável.
A culpa não é propriamente dos zagueiros, mas da confusão entre eles e, sobretudo, da falta de marcação nos outros setores do campo, o que permite aos adversários chegarem sempre em boas condições perto de nossa área.
O curioso é que esse desequilíbrio entre defesa e ataque parece se encarnar em cada jogador.
O mesmo Edmilson que tomou infantilmente duas bolas pelo meio das pernas fez um dos gols mais espetaculares da Copa. O mesmo Júnior que quase marcou contra, chutando uma bola "de rosca" na nossa área, foi eleito o melhor em campo pela Fifa.
E os dois são meros reservas! Só agora, depois de ver tantas partidas sem brilho na Copa, podemos ter a dimensão da alta qualidade de nossos atletas.
Como escreveu João Saldanha em 82, numa crônica incluída no livro "O Trauma da Bola", "o que sempre tonteou nossos adversários foi que o negócio poderia vir por qualquer lado".
O problema é organizar esses talentos, de modo a impedir que sejamos eliminados pela eficiência de uma Dinamarca ou a força de uma Inglaterra (se passarmos pela seleção da Bélgica, obviamente).
Outro dia escrevi que Denílson era a cigarra, deixando o trabalho de formiga para os outros. Pensando melhor, todo jogador brasileiro -com a possível exceção de Emerson- tem vocação para cigarra. Só marca o adversário sob ameaça de tortura.
Foi com isso na cabeça que fiz aqui uma defesa um tanto despropositada do futebol argentino. Projetei na equipe argentina meu ideal de futebol que unisse organização e criatividade.
Com exceção da vitória sobre a Nigéria, o time de Bielsa ficou devendo nos dois quesitos. Foi uma promessa que não se cumpriu. O Brasil não prometeu nada, e por enquanto está cumprindo.

jgcouto@uol.com.br



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