São Paulo, sexta-feira, 15 de julho de 2005

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FUTEBOL

O dia em que o geraldino se deu bem

MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA

Acabaram, noutro dia, com a geral do Maracanã. O Juca Kfouri não achou ruim, já que considera um abuso submeter o torcedor a um espaço de onde mal se consegue ver o jogo. O José Geraldo Couto foi contra: diz que botaram os geraldinos não apenas para fora do seu território, mas do estádio, por falta de grana para ingressos mais caros.
Desconfio que os dois têm razão. A geral era expressão de segregação social. Quase ao nível do campo, inexistia noção de profundidade para quem assistia à partida dali. Os jogadores pareciam estar na mesma linha, como no pebolim (denominação paulistana), totó (carioca) ou Fla-Flu (porto-alegrense, quem diria).
Não é a mesma coisa que ir ao Teatro Municipal, a 15 minutos do Maracanã. A galeria, setor distante do palco, é a opção mais barata para quem não pode encarar uma poltrona na platéia ou no balcão nobre. Mas não se perdem de vista os movimentos dos bailarinos. Na geral, se perdia, mesmo quando uma concretada elevou o piso.
Os geraldinos foram bons para o Canal 100 e para os artilheiros comemorarem seus gols com a torcida. Quem mais exaltava a "originalidade" dos geraldinos não queria saber de acompanhar jogo lá de baixo.
O que seria para aplaudir -o fim do apartheid da geral- talvez não seja. Porque livraram os geraldinos do buraco, mas nada ofereceram em troca. A não ser promoções demagógicas, com fundos do Estado, de entrada a R$ 1.
Foi como se anunciassem na África do Sul de ontem: os negros não estão mais condenados ao curralzinho do fundão do ônibus; agora, não podem nem mais entrar nos ônibus. Agitam-se prisões na Daslu, mas se presenteia a banca com lucros pornôs.
Para não elitizar ainda mais o público, parte da arquibancada ou das cadeiras deveria ter preços de geral. Mas não duvido de que haja quem sonhe com o fim da geral como a solução final para os geraldinos: o olho da rua.
Só fui uma vez à geral do Maracanã. Tão desagradável quanto ver mal é ficar o tempo todo de pé. Assim fiquei na única incursão na geral do Morumbi. A trabalho, na decisão da Libertadores-92 entre São Paulo e Newell's.
Quis contar como seria ver, de baixo, o time dos de cima, o clube da elite. Nos pênaltis, os fotógrafos taparam a visão de quem estava atrás do gol. Na geral, esperava-se que arquibancadas e numeradas se manifestassem para saber se a bola fora boa ou não. Não viram a defesa do Zetti.
Para celebrar o título, contudo, quem invadiu o campo foram os geraldinos. Invadi junto. Um deles abriu a bandeira são-paulina, deitou-se sobre ela, cruzou as pernas, acendeu um cigarro e pediu: "Apaguem as luzes, que eu quero dormir".
Naquela noite, não sei se o Telê dormiu. Dez anos depois do Sarriá, o gênio triunfava. E quem festejou ao seu lado, ali no campo, não foram os de cima, mas os de baixo, pois a hora dos geraldinos chegara.

No dos outros
Em 92, o presidente são-paulino era José Eduardo Pimenta. Anos depois, a torcida brindou-o com gritos de "Pimenta, ladrão, São Paulo campeão". Ele reputa injusto o coro. Registro: na gravação que custou a carreira de Pimenta como cartola, feita por um empresário, as instruções para o uso do gravador oculto foram passadas por um jogador do clube.

Pingüim
Jogador em fase ruim vai para o banco. Técnico é demitido. Por que o árbitro Wagner Tardelli, de desastradas atuações, ainda não foi para a geladeira?

Fair play
Para não restar dúvidas: esta coluna foi escrita antes da decisão de ontem da Libertadores.

E-mail mario.magalhaes@uol.com.br


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