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"Procuro sair
de fininho",
conta Bigode
DA REPORTAGEM LOCAL
"Vai, Bigode", gritavam as 200
mil pessoas no Maracanã cada vez
que Ghiggia apontava em direção
ao gol brasileiro.
Mais do que alertar, o coro atordoou o médio João Ferreira, o tal
Bigode, que não conseguiu parar
o endiabrado ponteiro uruguaio
ao longo do jogo e, pior, no gol
que decretou a derrota brasileira.
Além de tudo, Bigode foi acusado de se acovardar após um tapa
de Obdulio Varela que, ele jura,
nunca existiu.
Bigode largou o futebol em
1957, passou a trabalhar como
técnico de rádio e TV. Quando ia
à casa de um cliente, muitas vezes
escondia o rosto com um aparelho para evitar gozações.
Pagou ao extinto INPS tributos
sobre cinco salários mínimos por
dez anos. "Depois o pulso abriu e
eu não pude mais trabalhar. Hoje
recebo só dois salários. Alguém
está comendo esse dinheiro."
Aos 78 anos, mora em São Mateus, litoral do Espírito Santos, de
favor, num quarto na casa de um
compadre.
(FV)
Folha - O que mudou no comportamento das pessoas nesses 50
anos?
Bigode - Eu não tenho sofrido
muito, não. Porque eu sou um
pouco tímido, de maneira que as
pessoas quando querem me agredir, procuro sair de fininho, viu,
sem discussão, sem nada. Peço até
desculpas, viu (risos).
Folha - Mas ainda pegam no seu
pé, vêm falar?
Bigode - Não, é muito difícil.
Porque, em primeiro lugar, não é
toda a gente que está viva, né, puxa. Porque são 50 anos depois, né.
Folha - Criticaram mais você ou o
Barbosa?
Bigode - Eu fui mais criticado,
lógico. Porque inventaram o tapa
do Obdulio Varela. Com o gol do
Ghiggia, já viu, né. Dois a zero.
Folha - Você esteve recentemente no Maracanã, no jogo Brasil x
Uruguai. Fazia quanto tempo que
você não ia lá?
Bigode - Ah, já tinha mais de cinco anos. Desde que eu saí do Rio.
Porque (quando morava no Rio)
de vez em quando eu ia, né, puxa,
assistir um joguinho. Depois fui a
Belo Horizonte, fiquei lá uns tempos, agora estou aqui. E daqui resolvi... resolvi, não, me levaram.
Por conta própria eu não iria não.
Não tenho muita emoção mais
não, viu, puxa.
Folha - O que você achou do jogo?
Bigode - Tem muitos jogadores
novos, de maneira que enfrentar
o Maracanã não é fácil, não, viu,
puxa. A responsabilidade é muita
e às vezes dá uma tremedeira ou
uma infelicidade num lance qualquer. E a torcida, ela exige demais,
viu, puxa. Exigem porque não estão lá dentro, né.
Folha - E o seu encontro com o
Ghiggia?
Bigode - Achavam que eu era
inimigo do Ghiggia. Ele estava do
outro lado da fila e alguém se interessou que eu falasse com ele. Ele
veio a mim e demos um abraço
um no outro e tudo bem.
Folha - Você diz que não levou tapa de Obdulio Varela, como foi difundido durante muito tempo.
Quem criou essa história?
Bigode - Por causa do veneno
dos jornalistas. Criaram a mentira. Nominalmente, eu não sei.
Mas os jornais e as revistas já estavam prontos para o Brasil campeão do mundo, você sabe disso...
Os erros começaram deles, que
deram força ao adversário.
Folha - Tem algo que você ainda
gostaria de falar sobre o jogo?
Bigode - Não, eu apenas acho
que houve um erro dos cartolas.
Porque nós estávamos tranquilamente (concentrados) lá para o lado da Barra do Tijuca, no Joá. E
depois, nas vésperas, põem a gente em São Januário. Então os seus
próprios colegas da imprensa lotavam lá o campo do Vasco todo
dia. Não tivemos descanso, era
muito tumulto. E muito político
também ia lá. Foram parte dos
culpados também.
Folha - Parece que você era um jogador muito viril...
Bigode - Eu era violento, sim.
Procurava a violência, mas dentro
do normal, né, puxa. Tanto que
nunca quebrei perna de ninguém.
Eu era viril, o que é que eu posso
fazer, pô.
Folha - Será que a lembrança daquela derrota nunca vai morrer?
Bigode - Um dia tem que desaparecer, né, puxa. Você ter que
contar a história para todas as gerações daqui a mais cem anos,
acho que é um absurdo. Mas vai
ficar na história. É possível. Agora, que eu não vou ficar fazendo
aniversário todo ano, né, puxa.
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