São Paulo, sábado, 16 de julho de 2005

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MOTOR

Assim contou o Chico

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

A viagem durou umas duas horas. Mas que poderiam ter sido dez. No banco de trás do pequeno carro, porque se recusou a ir na frente, estava o Chico Rosa.
O Chico, ex e atual administrador de Interlagos. O Chico, que sujou a mão de graxa na equipe Willys. O Chico, cuja obra-prima foi ter identificado naquele moleque o maior talento da turma. Que em 1969 argumentou e o convenceu a vender umas tralhas e viajar para a Inglaterra. Que foi um dos responsáveis pelos dois primeiros títulos do país na F-1.
E, para prazer de quem o cerca, o Chico, contador de histórias.
Silverstone, último fim de semana. Ele estava por lá, envolvido em reuniões sobre o GP Brasil. "Domingo, depois da corrida, vocês me dão uma carona até Londres?", pediu. "É claro, Chico."
Começava a cair a noite na ilha quando ele se acomodou no banco de trás. Talvez não imaginando que teria que "pagar" a carona, pelo mesmo trajeto que percorreu dezenas de vezes com Emerson, respondendo a curiosidades dos jornalistas à frente.
E, dos muitos causos que contou, e que estão sendo reunidos em livro, o mais fascinante não se passou na F-1, mas na extinta F-2.
Até meados dos 70, era comum pilotos de F-1, campeões inclusive, disputarem provas da categoria inferior nos fins de semana de folga. Os salários, afinal, não eram tão milionários e eles precisavam colocar pão na mesa de casa.
Tudo começou com uma das minhas muitas perguntas: quem foi o maior piloto que ele viu? A resposta, na lata: Jochen Rindt.
O ano não é tão importante, foi nos 60. O circuito, sim, importa: Rouen, no oeste da França, com sua pirambeira "à la Eau Rouge".
Rindt era um garotão em meio a macacos velhos como Clark, Hill, Hulme e Brabham. E virou alvo de gozações quando, dias antes, num bate-papo informal, disse que contornava a Sanson, no fim da pirambeira, "flat". Ou seja, sem levantar o pé do acelerador.
A trupe chegou a Rouen, e as gozações aumentaram. Afinal, era impossível alguém tentar fazer aquela seqüência de curvas sem aliviar o pedal. O garoto, petulante, encheu-se de tanta provocação e aumentou o desafio: não só percorreria o trecho "flat" como o faria na primeira volta.
Pois bem, o início da tomada de tempos foi autorizado e só o austríaco estava no carro. Todos os outros pilotos, amontoados num morro, à espera do acidente certo.
Rindt saiu dos boxes acelerando como um louco. Apontou na descidona e veio "descascando a peroba", para usar as expressões do Chico. Todos se levantaram, como que para ouvir melhor o som da vacilada no motor. Que não veio. O carro deu uma escorregada, o rapaz corrigiu o traçado e, sim, fez as curvas sem aliviar.
Mas a quase escapada não estava planejada. Ficou na pista e, na segunda volta, fez o trecho com precisão. Parou então nos boxes e inverteu a mão do desafio. "Agora batam o meu tempo", lançou.
Ninguém conseguiu. Com duas voltas, Rindt foi pole. E venceu.
Fato ou lenda, assim contou o Chico. Para nós, virou verdade.
Só é pena que Silverstone não seja mais distante de Londres.

Resistência-1
Trinta e seis anos após cruzar o Atlântico com Chico Rosa, Emerson enfrentará hoje em Nuremberg, na Alemanha, Prost, Scheckter, Mansell, Doohan e Cecotto. Eles participarão da "Race of Legends", que de corrida, aliás, não tem nada. Cada um dará nove voltas e o mais rápido levará US$ 1 milhão. Ontem, nos treinos, Prost foi o mais veloz. Admitindo estar enferrujado, o brasileiro ficou em quarto.

Resistência-2
Vai acabar em pizza, ninguém será punido, mas se engana quem acredita que o fiasco de Indianápolis não terá conseqüências. Apesar da iminente absolvição, os times continuarão a rebelião contra a FIA. O movimento só faz crescer dia-a-dia, e Mosley terá que abusar de sua lábia para continuar no poder nas eleições de outubro.


E-mail: fseixas@folhasp.com.br

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