São Paulo, domingo, 16 de agosto de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O diário do técnico

24 DE JULHO
Seguimos para o Galeão às 11h40. Fomos para o avião, e às 12h45 levantamos vôo. O dia está simplesmente magnífico. Depois de quatro horas de vôo, chegamos a Recife. Após mais uma hora, seguimos viagem. A noite estava maravilhosa. A lua cheia iluminava o interior do avião.
25 DE JULHO
Chegamos às 19h50. Ainda estava claro. Infelizmente houve confusão no horário e ninguém foi nos esperar. Depois de passar pelo serviço de alfândega, fomos para o nosso alojamento.
26 DE JULHO
A primeira impressão é boa, apesar dos contratempos. Estou em um quarto sozinho. É um antigo local de treinamento de oficiais e, em geral, os quartos são bons.
Nossa turma está toda em uma ala dos diversos edifícios. O alojamento é constituído de numerosos pavilhões, e todos são de madeira, mas muito bem arrumados.
As camas são ótimas, e existe cada cobertor formidável, além da lareira. As instalações sanitárias e os chuveiros são ótimos (água quente e fria).
A manhã está ótima. O clima está bem semelhante ao do Rio, no momento. Alguns jogadores não se sentiram bem.
Agora estamos descansando. Pretendíamos ir à cidade, mas fomos informados de que os bancos fecham às 15h. Não dá mais tempo. Aliás, neste particular está ruim a coisa. Os alojamentos são muito distantes uns dos outros.
Consta que o nosso é o pior. Estão conosco países eslavos e torna-se difícil a conversação. Assim, sobre este aspecto de contato e aprendizagem, a coisa está difícil.
O nosso alojamento fica em West Drayton. Depois do jantar, fomos fazer uma gravação para ser transmitida pela BBC para São Paulo. Passeamos e às 22h30 fomos dormir.
De um modo geral, o que chamou a atenção durante o dia de hoje: as moças e rapazes que servem as refeições e limpam os quartos são estudantes de universidades e pertencem às melhores famílias; no alojamento há televisão, barbeiro, lavanderia, correio, cafeteria, sala de estar com piano e rádio, área gramada, livraria; a grande limpeza de tudo; o grande número de garotos (4 a 10 anos) que pedem autógrafos; a água é muito ruim, parece ser salgada; número enorme de pessoas que andam de bicicleta; camionetes dirigidos por moças ou senhoras à disposição dos olímpicos.
27 DE JULHO
Levantamo-nos às 7h30 e depois do café fomos ao centro, ou melhor, a Londres. São quase duas horas de viagem.
Andamos quase 1 km e depois apanhamos o trem e o subterrâneo. Fomos ao banco e aproveitei para verificar alguns preços.
Comprei duas meias de lã. De um modo geral, não se pode fazer compras. Tudo depende de cupons de racionamento. A parte da cidade em que fomos está bem estragada pelas bombas. Notam-se ainda quarteirões inteiros totalmente arrasados.
Na volta, perdemos o caminho e só chegamos às 14h30. Às 16h fomos treinar. Houve trapalhada, de forma que fomos obrigados a voltar e seguir para outro lugar.
Fomos a Heston (bairro). O local de treino é uma quadra coberta (qualquer coisa do exército). Fizemos um bom treino. A camionete que nos levou ficou esperando, e às 19h estávamos de volta (20 minutos de camionete). Jantamos e fomos informados do sorteio. Infelizmente não fomos felizes.
Foi o seguinte o resultado geral: Grupo A - Canadá, Itália, Inglaterra, Hungria, Brasil e Uruguai (parece que Canadá, Uruguai e Brasil são os mais fortes); B - Filipinas, Iraque, Coréia, Chile, China e Bélgica (mais fortes: Filipinas, China e Chile); C - EUA, Suíça, Tcheco-Eslováquia, Argentina, Egito, Peru (mais fortes: EUA e Argentina); D - México, Cuba, Irlanda, França e Irã (mais forte: México).
Jogaremos dia 30, às 16h40, na Herringay Arena, contra a Hungria, e no dia seguinte contra o Uruguai. Por enquanto, só temos esperança e vontade de vencer. Á noite ficamos no acampamento conversando, assistindo televisão e às 22h30 recolhi a turma.
28 DE JULHO
São 23h. Tivemos hoje um dia bastante calmo, e por isso mesmo não encontrei grandes novidades. Levantamo-nos às 7h e fomos à ginástica. O Évora torceu o tornozelo. Logo em seguida, escrevi para casa e enviei alguns cartões.
Fui almoçar e, pouco depois, fomos treinar na Herringay Arena, que é a quadra onde serão efetuados os jogos.
A quadra é relativamente boa. O piso é adaptado e não tem a mesma elasticidade em todos os lugares. Há acomodações para 7.500 pessoas sentadas.
Treinamos contra Tcheco-Eslováquia e Irã. Estes são bem fracos. Assisti ao treino dos canadenses. Têm o mesmo estilo dos norte-americanos e muita facilidade no controle da bola.
Jogam com muita disposição, o que provoca muito contato de corpo. Em cinco minutos, arremessaram 14 bolas e acertaram 3.
A seguir, fomos para o acampamento, onde chegamos às 21h. Jantamos e fizemos um pequeno ensaio para o desfile de amanhã.
Durante o percurso para Herringay pudemos observar os graves danos causados pela guerra, tendo-se notado ainda: não há bondes; existem muitos ônibus, alguns dos quais são elétricos (dois andares); o calor está fortíssimo.
29 DE JULHO
Levantamo-nos às 8h. Às 11h tomamos os ônibus para o Wembley Stadium, onde seria realizado o desfile. A viagem durou uma hora. Ficamos nas proximidades do estádio, onde comemos um lanche.
O calor continua bem forte. Tivemos oportunidade, nessa espera, de assistir a um grande espetáculo, pois a diversidade de línguas, cores e uniformes era notável. Às 14h, aproximamo-nos do estádio. O povo das redondezas nos auxiliou grandemente, fornecendo água aos competidores.
No tempo em que estivemos perto do estádio tivemos oportunidade de apreciar a delegação do Paquistão, com sua indumentária típica. São camaradas, apesar de não podermos conversar. Em geral, andam de mãos dadas. Tiramos fotos com o turbante deles.
Às 15h entramos no estádio, que é maravilhoso. Tem acomodações para 100 mil pessoas. Nesse dia havia 80 mil, bem acomodadas.
À nossa frente iam Grécia, Argentina, Austrália e Bélgica. Passamos em frente à tribuna onde estava o rei George e sua senhora, a rainha-mãe, e um grande número de pessoas de fraque e cartola, flor no peito, apesar do calor intenso.
A emoção sentida é extraordinária quando se ouvem as palmas e demonstrações de alegria dadas pelo povo ao ver a representação do Brasil. Ficamos parados junto ao mastro da bandeira olímpica.
À passagem de cada delegação o rei se levantava e fazia continência. Depois de estarem todas as delegações no campo, o rei declarou abertos os Jogos Olímpicos. E houve mais as seguintes cerimônias: canto por um coro de 2.000 vozes, acompanhadas pela banda que tocou durante o desfile (todos com uniformes branco e vermelho e com aquele capuz preto, alto e peludo); revoada de pombos; chegada da tocha olímpica; hasteamento da bandeira olímpica; canto de aleluia; juramento do atleta.
De um modo geral, impressionou-me muito bem a organização e o cumprimento do horário. Os uniformes são bonitos. Talvez o do Brasil seja um dos mais simples. A grama dos estádio parece um colchão, de tão macia. É de um verde notável. Existem numerosas portas de saída. Não há grande preocupação de beleza ou arquitetura, mas sim de simplicidade e comodidade.
Terminada a cerimônia, voltamos para o acampamento, onde jantamos, descansamos e agora, às 23h30, o pessoal já está na cama, pois jogaremos amanhã contra a Hungria. Creio que não poderei contar com Évora (tornozelo torcido) e Alfredo (machucado na perna). Estou reduzido a oito jogadores, mas o ânimo da turma é ótimo. Creio que venceremos.
30 DE JULHO Levantamo-nos às 8h. Saímos para a Herringay Arena às 14h. Lá chegamos às 15h30. Antes de irmos à quadra, reuni os jogadores para entusiasmá-los. Juntos, de cortinas cerradas, pedimos a Deus que nos protegesse. Entramos em campo e, às 16h40, foi iniciado o nosso primeiro jogo, contra a Hungria. De início eles nos surpreenderam, pois jogam muito bem. São altos e fortes. Iniciamos com Ruy, Alex, Algodão, Braz e Pacheco. A partida transcorreu muito equilibrada. Não houve quem se distanciasse mais de cinco pontos. No final, conseguimos empatar: 39 a 39. Na prorrogação, que foi emocionante, vencemos por 45 a 41. Foi uma grande alegria para todos nós. Ficamos sabendo depois que os húngaros são os vice-campeões da Europa. Voltamos às 18h30, muito satisfeitos e cantando durante toda a viagem. Cantamos muito: "ai, ai, ai, está chegando a hora". Agora, 22h30, a turma já está na cama, pois jogaremos amanhã. Durante nossa viagem observei: as casas são feitas em grupos e todas do mesmo tipo; as casas comerciais não têm vitrines luxuosas; algumas filas em açougues. 31 DE JULHO Estou simplesmente satisfeitíssimo. Vencemos o Uruguai: 36 a 32. O pessoal estava disposto e com vontade de vencer o jogo, pois o considerávamos o mais difícil. E lembrando ainda que o Uruguai nos venceu no ano passado no Rio -ocasião em que eu "meti o pau" no nosso time. Essa vitória, para mim, foi uma vitória dupla. No princípio do jogo -Braz, Pacheco, Massinet, Algodão e Ruy- não tivemos muita sorte, e eles logo marcaram 7 a 1. Aos poucos, porém, fomos melhorando. Substituí o Braz por Alfredo e deu ótimo resultado. No final do primeiro tempo, vencíamos por 22 a 20. Logo no começo do segundo tempo começamos a aumentar essa diferença, que chegou a ser de 11 pontos. Éramos os donos da quadra. Infelizmente, porém, o Massinet completou quatro faltas e precisei substituí-lo. Entrou o Alex. Pouco tempo depois, o Ruy também fez a quarta falta, e entrou o Vinícius. Com essas substituições, o time decaiu um pouco, e no final, graças a Deus, vencemos por 36 a 32. Esse final foi emocionante. Quase todos estavam chorando de alegria. O Pacheco chorou como criança. O Alfredo teve uma espécie de vertigem. Enfim, todos ficaram muito emocionados. Creio que faremos melhor figura daqui por diante. Chegamos no acampamento às 19h30. Jantamos e fomos dormir. Amanhã é domingo, teremos folga absoluta. 1º DE AGOSTO Levantei-me às 9h. Agora, 10h30, escrevo cartões e uma carta para a Wally. Estou preocupado com a falta de notícias. São 22h30. Passei o dia todo no acampamento com os jogadores. Agora à noite houve uma festinha dos austríacos. Um deles tem uma sanfona, e a música só serviu para fazer com que eu sentisse mais saudades de casa. Amanhã levantaremos às 6h, pois jogaremos às 9h contra a Inglaterra. Se Deus quiser, venceremos. 2 DE AGOSTO Levantamo-nos às 6h, e às 7h15, depois do café, tomamos o ônibus para Herringay. Chegamos às 8h30, e às 9h foi iniciado o jogo. O nosso time era Alfredo, Algodão, Massinet, Pacheco e Ruy. Foram feitas várias substituições, e no final vencemos por 76 a 11. Julgamos que haveria vantagem em fazer o maior número de pontos, porém, à tarde, descobrimos que não havia "goal average" para todos os times, mas só para aqueles que terminassem empatados. Foi pena, pois poderia poupar um pouco mais os jogadores. A vitória foi espalhafatosa. Os jogadores tinham ordem para supor que faltavam cinco minutos para terminar um jogo em que estávamos perdendo e, por isso, deveriam dar tudo. Assim foi feito, e vencemos por 65 pontos de diferença. Agora tudo está OK. Tudo a nosso favor. Não acredito ainda que reconheçam o meu trabalho, e por isso redobrarei os esforços, pois faço questão de dizer no futuro muita coisa a várias pessoas. Se Deus quiser, assim será. O nosso lema tem sido: "Com Deus e pelo Brasil". Com ele, pretendemos ir longe. Assistimos a alguns jogos, e às 23h30 estamos de volta. Dos times que jogaram hoje, gostei de EUA, Hungria, Canadá e China. Os EUA têm grandes valores individuais. São velozes e arremessam muito bem. Tivemos a oportunidade de assistir a dois deles executarem a bandeja de cima para baixo (como se fosse uma cortada no vôlei). A Hungria joga feio e em posições elegantes, porém de forma positiva. Venceu o canadá, que não demonstrou ser grande coisa. A China demonstrou conhecer basquete, porém marcam mal e fazem muito fricote com a bola. Hoje à tarde choveu. Esfriou um pouco. 3 DE AGOSTO Levantei-me às 8h30, pois não havia nada programado para o período da manhã. Depois do café escrevi uns cartões e fiquei conversando com a turma. Almoçamos às 12h30. Chegou a mala do correio logo em seguida, mas, infelizmente, a esperada carta de casa ainda não chegou. As saudades estão aumentando, e nenhuma carta até hoje. Passei a tarde com a turma no alojamento. Às 17h, fizemos um acerto em nossa jogada de ataque para enfrentar o Canadá. Também fizemos uma gravação para ser irradiada para São Paulo. Jantamos e, às 22h, fomos deitar. 4 DE AGOSTO Levantamo-nos hoje às 8h. Depois do café, demos umas voltas e acertamos mais alguns pontos da nossa jogada para hoje. Almoçaremos às 12h, e às 2h, depois de um repouso, tomaremos o ônibus para Herringay, onde jogaremos com o Canadá. Todos estão bastante animados e com grande vontade de obter mais uma vitória. Há pouco fomos verificar se havia cartas. Infelizmente, nada. São 23h30. Graças a Deus, vencemos o Canadá, por 57 a 35. Foi uma vitória simplesmente notável. Nosso time começou com Pacheco, Braz, Ruy, Massinet e Algodão. A produção foi extraordinária. Executaram tudo o que fora previsto. Aproveitamos muito bem os contra-ataques. Enfim, fizemos verdadeira exibição de basquete. O primeiro tempo terminou 32 a 12. No final, os dois técnicos canadenses vieram me cumprimentar. Um deles declarou à imprensa que eles perderam porque "não tinham jogo" para nos enfrentar. Creio que continuaremos cumprindo a promessa de honrar o bom nome esportivo do Brasil. Terminado o jogo, fomos para o acampamento cantando as célebres músicas das vitórias. Jantamos, e estive cuidando do Massinet (ameaça de gripe), Pacheco (idem), Alfredo (idem) e Algodão (torção no tornozelo). No entanto, creio que não será nada. Jogaremos amanhã com a Itália. Se vencermos, o que acredito que acontecerá, sairemos invictos da nossa chave. À noite, ouvi algumas valsas vienenses (sanfona) e, em parte, perdi a alegria da vitória, pois as saudades são cada vez maiores. Continuo estranhando o fato de não receber cartas. 5 DE AGOSTO Levantamo-nos às 8h. Depois do café, demos umas voltas e escrevemos cartas. Almoçamos às 12h. Depois de um descanso, tomamos o ônibus para a Herringay. Às 16h40, jogamos com a Itália. Vencemos por 46 a 31. Desse modo, terminamos invictos a série inicial. Terminado o jogo, dissemos algumas palavras pelo rádio. Infelizmente, a turma demonstrou cansaço, e alguns estão machucados. O Alfredo sofreu pela segunda vez uma pancada no músculo da perna. O Évora e o Pacheco sentiram o tornozelo. Todos os dirigentes estão agora à nossa disposição. Prometeram-nos doces e "bóia" mais reforçada. Ficamos em Herringay até as 22h, assistindo a jogos. Jantamos lá. Foi a primeira vez que comi fora do acampamento. Tive oportunidade de verificar que de fato o pessoal daqui come muito mal. Serviram-nos sopa de tomate, frango com vagem e duas fatias muito finas de pão com manteiga. De sobremesa um sorvete, e para encerrar um café muito ruim. Fui para o alojamento na expectativa de encontrar uma carta, porém nada... mais uma vez. 6 DE AGOSTO Levantei-me às 9h. Escrevi alguns cartões. Logo em seguida, tive a grande satisfação: um telegrama de papai informando que todos estão bem. Pouco tempo depois, uma carta da Wally aumentou a alegria. Ao que parece, sexta-feira é mesmo o meu dia. Às 15h, levei o Alfredo, Algodão, Pacheco e Évora à Herringay, pois todos eles precisavam de tratamento mais completo para estar em perfeita forma na segunda. Hoje houve o sorteio. Pegaremos os tchecos, que venceram os argentinos. Vemos a possibilidade de sermos, ao menos, vice-campeões, pois se vencermos os tchecos teremos, a seguir, um adversário que não é dos melhores. Vejo a possibilidade, mas ainda não acredito. Penso que é muita coisa. Quando me lembro, no entanto, que o que estamos fazendo é sob o lema "Com Deus e pelo Brasil", o entusiasmo já é outro. Lembro-me sempre dos "amigos da onça" aí do Brasil. Com certeza, eles agora acham que tudo isso foi sorte. Que pensem o que melhor entenderem. Eu sei o esforço que esses rapazes têm feito. O sacrifício a que têm se submetido. Se Deus quiser, porém, tudo isso será recompensado. Sem dúvida, hoje foi uma grande sexta-feira: recebi notícias, e tivemos sorte no sorteio. 7 DE AGOSTO Levantei-me às 8h. Fui com Pacheco, Évora, Alfredo e Algodão ao massagista na Herringay. Felizmente todos estão bem melhores. Voltamos às 12h30 e fomos almoçar. Às 15h, Massinet, Marson, Ruy, Vinícius, Évora e Alex fizeram massagem. O comitê providenciou a vinda de um massagista para nós. A turma continua com o moral elevado, e todos estão bastante unidos. Acreditam que o jogo com os tchecos será difícil, no entanto confiam na vitória. O desejo de chegar às finais é enorme. Da minha parte também estou menos preocupado. Os que estavam machucados já apresentaram melhoras, e os demais demonstraram ter aproveitado o descanso. Jantamos às 19h30, e em seguida fui escrever uma carta para casa.
8 DE AGOSTO
Levantamo-nos às 8h30. Chove bastante, de forma que não foi possível dar a ginástica que eu pretendia. Como eu previra, passamos um dia bastante monótono.
Jantamos às 19h. Logo em seguida, aproveitando que a chuva parou um pouco, a turma armou um samba, do qual participaram até os egípcios. Filmei o pessoal. Agora -22h30- já estão todos na cama. Amanhã jogaremos com os tchecos. Ainda não tenho certeza de poder contar com todos os jogadores, pois o Alfredo e o Pacheco não estão perfeitamente bem.
9 DE AGOSTO
Levantei-me às 8h. Logo depois do café, recebi uma longa carta da Wally. Em seguida, carta de papai.
Recebemos um grande número de telegramas. Creio que já estamos com 60 pregados na parede. Às 13h fomos para a quadra. Às 15h20 começou o jogo com a Tcheco-Eslováquia.
Graças a Deus, vencemos, por 28 a 21, depois de um jogo relativamente difícil. Eles marcaram por zona, e o nosso pessoal encontrou alguma dificuldade.
Mas vencemos, e com isso temos o quarto lugar, no mínimo, garantido
Tivemos hoje uma grande torcida. Quase todos os atletas que aqui estão foram assistir ao jogo e armaram um grande samba.
A França derrotou o Chile, na prorrogação. Desse modo, jogaremos com os franceses. O México venceu a Coréia, e os EUA, o Uruguai. O jogo com a França deverá ser difícil, porém acredito que venceremos. Seremos então, no mínimo, vice-campeões.
10 DE AGOSTO
Levantei-me às 8h30. Creio que hoje batemos o recorde em número de telegramas. Devemos estar com cerca de 120 na parede. Dos recebidos, destaco o assinado pelo brigadeiro Eduardo Gomes.
Depois do almoço, fizemos uma gravação para ser transmitida para o Brasil. Às 14h, fui com Pacheco, Alfredo e Braz à Herringay, pois eles precisavam de tratamento. Com exceção do Pacheco, creio que poderei contar com todos.
Depois do jantar, tratei dos doentes. Aplicamos de infra-vermelho no Braz, Pacheco e Algodão. Agora, 23h30, já estão todos na cama. A confiança na vitória de amanhã é grande. Faremos muita força pelo vice-campeonato.
11 DE AGOSTO
Levantei-me às 8h. Fui com Pacheco, Braz e Évora fazer aplicações de infra-vermelho. Chove bastante, de forma que a turma não pode nem sair do alojamento.
Estamos com grande esperança na vitória. São 19h. Estou satisfeitíssimo, pois conversei com a Wally e papai, por meio da Rádio Record. Foi uma oportunidade admirável. Todos nós ficamos bastante emocionados por ter ouvido a voz de nossos entes queridos. Vamos agora para a quadra.
Acabamos de chegar -meia-noite e meia. Perdemos o jogo com a França. Francamente, não sei o que escrever. É muita coisa que tenho em mente.
Eu me conformaria com outra derrota, mas não com esta. Em condições normais, tenho certeza de que venceríamos com facilidade. Eles estiveram com muita sorte, e nós exatamente o contrário. Perdemos por 42 a 32.
A turma está inconsolável. Vários deles choraram como crianças. Eu sinto imensamente essa derrota, pois pretendia entregar o vice-campeonato à Wally. Enfim, só nos resta nos consolar.
É muito triste perder nestas condições, depois de uma série tão grande de vitórias e de estar tão perto do segundo lugar. Os jogadores estão simplesmente extenuados, e alguns deles bem machucados. Creio que não poderei contar mais com Pacheco, Algodão e Évora. Outros -Alfredo, Braz e Massinet- queixam-se de dores musculares.
Jogaremos sexta-feira com o México na disputa do terceiro lugar. No momento, acho difícil vencermos. Acredito que eu tenha feito o possível. Queimei todos os cartuchos. Experimentei tudo, mas não deu certo.
Sinto falta de palavras de estímulo e consolo neste momento. Vou parar aqui, pois não consigo coordenar os pensamentos.
12 DE AGOSTO
Levantei-me tarde. Dormi muito mal, pois a derrota não saía do meu pensamento. Quase todos se queixaram da mesma coisa.
São 23h. A turma já está na cama. A disposição de todos melhorou um pouco. Alguns já falam em vencer o jogo amanhã. Da minha parte, tenho entusiasmado os jogadores, mas intimamente não acredito em vitória. Todos estão cansados. O México só perdeu para os EUA e, anteriormente, venceu a França.
13 DE AGOSTO
Levantamos às 8h30. Está bem frio. Escrevi vários cartões antes do almoço. Agora, 17h, estamos quase prontos para ir disputar nosso próximo jogo.
A turma está animada, mas duvido que consigamos vencer.. Na "hora H" sei que aparecerá o cansaço. Tentaremos mais este grande esforço.
Vencemos: 52 a 47. Somos os terceiros colocados. A satisfação é enorme. Francamente, não sei onde esse pessoal foi buscar tanta fibra, tanto entusiasmo. Depois de uma série de sete jogos, ainda disputaram uma grande partida.
Além da vitória, ainda tivemos a nosso favor: foi o México o único país que havia derrotado a França; chegamos ao terceiro lugar com oito jogos e uma derrota (a França disputou sete jogos, teve duas derrotas e ficou em segundo lugar); os jogadores terão direito a medalhas; a bandeira brasileira será hasteada amanhã, em Wembley, e o basquete foi o único esporte do Brasil que conseguiu isso.
O jogo foi duríssimo. No primeiro tempo, perdíamos por oito pontos. No segundo tempo, acertamos mais nosso jogo e vencemos por cinco pontos. A vitória foi em parte uma surpresa para mim, pois eu não acreditava que os jogadores ainda tivessem forças para mais uma luta dessas.
Terminei hoje meu compromisso. Estou com a consciência tranquila, pois cumpri meu dever de brasileiro e de esportista. Exatamente depois de dois meses da minha indicação para o cargo de técnico (13 de junho), entrego ao Brasil e à Wally o terceiro posto na Olimpíada. Até a cama eu já acho melhor. Talvez pela vitória. Talvez por terem trocado a roupa de cama (trocam semanalmente).
Vou dormir sossegado, mais uma noite, graças a Deus.
14 DE AGOSTO
Às 13h foi iniciada a cerimônia de encerramento.
Fomos para o centro do campo, e o capitão de cada turma (EUA, França e Brasil) subiu no palanque, com os jogadores na sua retaguarda (Ruy foi o nosso capitão). Feita a entrega das medalhas, foi afixado no quadro: "Basquete: EUA, França e Brasil".
Acima do quadro estavam as três bandeiras. Depois da entrega das medalhas, viramos para o lado das bandeiras. Foi ouvido, então, o hino nacional norte-americano.
Enquanto tocavam, eu fiquei olhando para a nossa bandeira e me senti, ao mesmo tempo, emocionado e felicíssimo. Lembrei-me de casa, da Wally, dos treinos, dos "amigos da onça", enfim, de inúmeras coisas e pessoas.
Terminada a cerimônia, fomos almoçar. Chegando, fiquei assistindo a todas as demais cerimônias de encerramento da Olimpíada pela televisão.
Depois do jantar, saí com alguns rapazes. Fomos a um bar tomar um chope. São interessantes os bares. A turma fica de pé bebendo, cantando, e alguns dançando (sozinhos). Num canto ficam as mulheres, bebendo e cantando. Enfim, é o tipo de farra gozada.
Às 22h30, encerram a venda de bebidas, e o pessoal é obrigado a ir embora. Depois de muito conversarmos aqui no acampamento, fomos dormir.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.