UOL


São Paulo, sábado, 17 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Após colecionar polêmicas, goleiro palmeirense começou ontem voto de silêncio para a imprensa

Marcos decreta seu cessar-fogo

Eduardo Knapp - 6.jan.03/Folha Imagem
Marcos dá, durante a pré-temporada do Palmeiras, a primeira entrevista após um período de silêncio, que foi reiniciado ontem


RODRIGO BERTOLOTTO
DA REPORTAGEM LOCAL

O goleiro Marcos cansou temporariamente do papel de metralhadora giratória e começou ontem seu cessar-fogo.
Como fez na campanha do rebaixamento, decretou voto de silêncio por tempo indeterminado -só fala com a imprensa quando a língua voltar a coçar.
Anteriormente, para conter seu dilúvio verbal, o palmeirense tinha convencionado dar entrevista um dia antes e no próprio dia do jogo, nos vestiários.
Não adiantou. Foi uma polêmica atrás da outra, sem poupar ninguém. Nem temas tabu do futebol, como álcool, fumo, maconha e homossexualismo, escaparam das suas declarações.
"Fumo um ou dois cigarrinhos quando tomo uma cerveja. Gosto de dar uns tragos. Tem jogador que faz coisa pior, sai com traveco, vai para a noitada depois dos jogos, bebe, e ninguém fala nada", soltou para câmeras de TV.
Ele mesmo confessou que se arrependeu no meio da frase, mas não dava para voltar atrás.
Dias depois, reclamou da repercussão. "Isso deu mais polêmica do que o Giba ter fumado maconha. Acho que vou mudar para maconha", lembrando o caso de doping do jogador de vôlei.
A confissão pública de seu vício veio pouco depois de ele abdicar de um amistoso da seleção por estar tratando de um princípio de bronquite. Zagallo e Carlos Alberto Parreira criticaram a postura do goleiro tido com titular.
Marcos não se deu por rogado. "Eles não deviam lavar roupa suja na imprensa. Falassem comigo."
Na verdade, uma conjunção de problemas pessoais, profissionais e de saúde fazem o goleiro oscilar entre o desânimo e a irritação.
Pelo lado particular, Marcos tem de lidar com o pai, seu Ladislau, com sérios problemas cardíacos, e a gravidez da atual namorada. Profissionalmente, sofre tendo à sua frente o pior time do Palmeiras com que trabalhou e tendo de encarar a segunda divisão.
Por último, Marcos teve sua capacidade pulmonar ameaçada pela bronquite. Para seu preparador, Carlos Pracidelli, o goleiro tem se cansado muito nos treinamentos. Todo esse entorno parece contribuir para isso.
Pracidelli foi quem condicionou Marcos para suas excelentes atuações na Copa do Mundo. Suas defesas foram tão decisivas quanto os gols de Ronaldo e Rivaldo, mas, no regresso ao Brasil, o goleiro queria de volta sua condição de mero palmeirense. Tanto é assim que, nos festejos em Brasília, vestiu a camisa verde no palácio do Planalto. "Por favor, parem com essa história de pentacampeão. Foi gostoso, mas já acabou."
Renegou também o apelido ganho pelas defesas ditas milagrosas. "Me incomoda um pouco ser chamado de são Marcos."
O problema foi que sua carreira foi da água para o vinho. Depois de sua maior glória, veio a pior fase. O Brasileiro-2002 foi uma tortura para o número 1. Ele acusou o time de corpo mole ("Enquanto eu venho jogando com o ombro arrebentado, outros atletas que estão 100% não estão nem aí."). Depois, pediu para sair da lista de titulares. Isso lhe valeu um atrito com o então técnico Levir Culpi. "Se ele não quiser vir, que não venha. Estou precisando de homens aqui", afirmou o treinador ao saber da renúncia do goleiro.
Marcos voltou à equipe mais adiante, contundiu-se, mas voltou a tempo para as últimas partidas do fatídico rebaixamento.
Nesse ínterim, fez uma greve de entrevistas. Meses a fio, falou poucas vezes com a imprensa. Uma delas foi em seu apoio público ao candidato Paulo Maluf para governador do Estado. Outra aconteceu no lançamento de uma campanha publicitária.
O cenário só mudou em janeiro deste ano, quando o Palmeiras foi a cidade mineira de Pouso Alegre para sua pré-temporada. Lá, Marcos retomou seu relacionamento com microfones e câmeras.
Ele chegou até a pedir conselhos a jornalistas sobre a proposta de se transferir ao Arsenal, time inglês que já tinha acertado com o Palmeiras sua compra por US$ 4 milhões. Muito a contragosto, Marcos viajou a Londres, mas lá se negou a fazer alguns testes físicos. Preferiu encarar a segunda divisão brasileira.
E o roteiro de 2002 vem se repetindo em 2003: críticas, bate-bocas e, ao final, o silêncio.
Primeiro, pressionou os dirigentes por mais reforços: "Um time em que o goleiro é a principal estrela tem alguma coisa de errado". Depois, mostrou-se resignado com a condição da equipe. "Nosso time não impõe respeito. Já fomos grandes, não somos mais. Eu estou até bem treinado em explicar derrotas." Não poupou nem a si próprio. "Estou me lixando para a minha imagem. Se eu me importasse, fazia a barba todos os dias."
A gota d'água, porém, foi a vexaminosa derrota em pleno Parque Antarctica por 7 a 2 para o Vitória, que fatalmente eliminou a equipe da Copa do Brasil. Marcos falhou claramente em três gols. "Ainda bem que o Vitória não chutou mais a gol depois do 7 a 2. Eu não ia pular mais nas bolas."
Na estréia na Série B, contra o Brasiliense, teve nova falha. Dessa vez, em vez de raiva, Marcos usou da auto-ironia. "Nesse jogo falhei uma vez, no outro foram três. Sinal de que estou melhorando."
A torcida ainda grita "É o melhor goleiro do Brasil", mas Marcos sabe que seu crédito uma hora acaba. Por isso, é melhor ficar na moita. Tanta falação também estava incomodando a direção do Palmeiras, que aconselhou o goleiro a maneirar. Mas, se o time começar a vencer na Série B, logo ele volta a falar.


Texto Anterior: Painel FC
Próximo Texto: Campanha do Palmeiras é pior que a de 2002
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.