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JOSÉ ROBERTO TORERO
Minha primeira vez
Eu vi. Com estes olhos que a
terra há de comer. Eu estava
lá, no Centro Aquático, quando o
Brasil ganhou sua primeira medalha. Por um ingresso que custou
reles R$ 450, assisti ao vivo o Brasil ganhar sua medalha de bronze.
E foi, pode-se dizer, um bronze
dourado. Creio que só a mãe do
Edvaldo Valério acreditava que
ele pudesse recuperar duas posições nos últimos 50 m e ganhar
uma medalha. Mas ele não decepcionou sua progenitora e ainda
venceu com um braço de vantagem. Ou 34 centésimos, como
preferem os matemáticos.
O Centro Aquático estava cheio,
mesmo com um ingresso tão caro. Os australianos são animados
para a natação. São uma mistura
de torcida de futebol, com gritos
em coro, palmas e músicas, como
tietes de cantores sertanejos,
aquelas que ficam gritando o nome de seu ídolo. Só que, em vez de
berrarem ""Chororó, Chororó!",
elas urram ""Thorpe, Thorpe!".
Foi uma daquelas provas para
dar emoção. Primeiro tivemos
alegria, pois o Xuxa saiu bem e fez
os primeiros 50 m em terceiro lugar, mas logo veio a tristeza, pois
ele completou os 100 m em quinto. A esperança voltou com Borges, que recuperou uma posição.
Mas veio de novo o desespero,
porque Jayme entregou o bastão
em quinto lugar. Mas aí veio a redenção com Valério, que ultrapassou dois e trouxe o time para o
pódio. Fez um tempo excelente,
49s12, e mostrou o estilo mais bonito entre os brasileiros, já que os
outros três nadam de uma maneira mais nervosa, com braçadas
mais curtas e rápidas. São o oposto de Ian Thorpe, o Thorpedo.
Mas isso de beleza de estilo não
conta ponto e o que importa é que
ficamos em terceiro.
E é muito bom ficar em terceiro.
Ser terceiro é tropeçar na beira da
escada, mas conseguir segurar no
corrimão, é deixar cair um copo e
pegá-lo no ar, é chegar atrasado
ao primeiro encontro, mas, para
sua sorte, ela chega mais atrasada
ainda, pede mil perdões e diz que
por causa disso você pode escolher o programa que quiser. Na
verdade, ser terceiro é até melhor
que ser segundo. Era só ver a cara
dos norte-americanos no pódio
para ter certeza disso. Estavam
abatidos, com sorriso mais amarelo que a roupa dos australianos.
Além disso, o quarteto brasileiro foi um quarteto especial. Eles
são de cores diferentes, de lugares
diferentes (Florianópolis, Ribeirão Preto, Goiânia e Salvador) e
de idades diferentes (26, 27, 20 e
22). Dois são parte da melhor geração da nossa história e dois são
a melhor parte da história da próxima geração. E, com a quarta
premiação, Borges vira o maior
medalhista olímpico do Brasil. Eu
vi. Com estes olhos que a terra há
de comer. Ou melhor, que alguém
há de usar, pois eu sou doador.
E-mail torero@uol.com.br
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