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FUTEBOL
A miséria alheia
MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA
Poucas vezes, mesmo nos
seus dias mais sombrios, o futebol brasileiro roçou o fundo do
poço como na noite da terça. Foi
quando se transformou em cafetão da miséria alheia. O América
ofereceu uma dezena de empregos. Levou mais de 20 mil desesperados ao sorteio no Mineirão.
Em troca, queria apoio ao time
que despenca para a Terceirona.
Fracassou, em partida sem gols,
contra o CRB. Em campeonatos
sérios é assim: uns caem, outros
sobem. Buscar na tragédia social
o fermento para encher arquibancada é das passagens mais
sórdidas, embora não inédita, já
assistidas nos nossos estádios.
Não foram apenas as vagas na
construção civil e em um hospital
que chamaram o público. Havia
também 20 cestas básicas. Um
dos idealizadores da jogada estimava em 9.000 os aflitos a dar as
caras. Seria o triplo do maior borderô do clube na competição. Subestimaram a pobreza.
Cada espectador pagou R$ 1 pelo ingresso. No intervalo, sortearam os empregos. Camisas cruzeirenses e atleticanas equivaliam às
americanas. Nada a ver com solidariedade dos mais fortes com os
mais fracos, como em jornadas
que quem viveu não esquece. Não
se tratava de torcer. Mas de driblar os perrengues da vida. E cair
diante da miséria humana.
Quem quer criar emprego, porque precisa de mão-de-obra ou
por filantropia, pode e deve criá-los. É porém expediente abjeto
usar oferta de trabalho como chamariz para uma equipe que não
honra as glórias da agremiação
que neste ano festeja 92 anos.
O América divulgou que o presidente da CBF esteve na festa do
92º aniversário. Pouco tempo depois, Ricardo Teixeira foi um dos
artífices do jogo do Brasil no Haiti. Seria enfadonho revisitar divergências sobre o evento "humanitário". A novidade é um vídeo
de menos de sete minutos que a
CBF distribui.
Em meio a imagens arrepiantes
de haitianos saudando os jogadores brasileiros a caminho do estádio, impõe-se um protagonista:
Ricardo Teixeira. Na tela, aparece o mote: "Cooperação". O chefe
da CBF fala, microfone à mão, ao
lado do presidente da República.
Não se ouve o que diz. O dirigente
sorri quando Lula levanta a taça.
Após o verbete "Coragem", o primeiro plano é o de Teixeira a descer pela escada do avião.
Em "Sacrifício", o presidente da
CBF aparece falando no vestiário.
Em "União", reza o "Pai Nosso"
com o time. "Missão Cumprida"
mostra-o posando para foto com
Lula, Roberto Carlos e um engravatado local.
A seleção deixou logo o Haiti.
Os miseráveis que a aclamaram
nas ruas não entraram no estádio, por não serem beneficiários
dos convites para amigos e por
lhes faltar a fortuna relativa cobrada na bilheteria. Teixeira tem
mandato até 2008. Completará 19
anos no cargo, mais do que Havelange na CBD e Getúlio no Catete.
São raros os que acreditam que
ele pretende pendurar a cartola
às vésperas da possível Copa de
2014 no Brasil.
Profissão repórter
É uma aula de jornalismo a reportagem de Guilherme Roseguini sobre o grego que ajudou
Vanderlei Cordeiro de Lima em
Atenas. Comprova como,
aliando persistência à técnica,
se pode encontrar uma agulha
no palheiro mesmo a milhares
de milhas.
Rei esquecido
Pelé diz não saber que fim levou
o dinheiro da ex-gigante suíça
ISL investido no Flamengo. Segue a dica, sobre uma módica
parcela dos valores movimentados: US$ 3 milhões foram parar em duas contas da Pelé
Sports & Marketing Inc. Pelé
assinou um contrato como seu
presidente. Seu antigo sócio
Hélio Viana, como vice. Foram
eles que intermediaram o contrato da ISL com o Flamengo.
E-mail
mario.magalhaes@uol.com.br
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