São Paulo, quarta-feira, 20 de junho de 2001

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FUTEBOL

Verdadeiro nó tático

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Raramente o esquema tático de uma equipe é o fator determinante no resultado de uma partida de futebol, como o da vitória do Grêmio sobre o Corinthians.
No jogo, o chavão "nó tático" nunca foi tão verdadeiro.
Tite, técnico do time gaúcho, já tinha usado o mesmo laço para dar um nó no Vadão, treinador do São Paulo, no mesmo estádio do Morumbi.
Vadão ficou tonto, nocauteado, perdeu o emprego e ainda não retornou ao trabalho.
O nó que Luxemburgo recebeu do Tite foi tão apertado que o técnico do Corinthians ficou paralisado.
De vez em quando soluçava. Só não perdeu a pose. Não parava de ajeitar os óculos, como fazem os pseudo-intelectuais.
O Grêmio deu um baile no Corinthians. Escalou três zagueiros, sendo um na sobra, adiantou a marcação, pressionou, tomou a bola com facilidade no meio-campo e esteve sempre próximo ao gol do Timão.
A vitória do Grêmio foi a do novo e verdadeiro futebol moderno sobre o velho e ultrapassado esquema tático tradicional brasileiro.
De onde Tite tirou a inspiração para a brilhante maneira de jogar de seu time?
Não me refiro ao desenho com três zagueiros e dois alas. Foi o que menos importou. Não teve nada de novo e especial. O mais importante foi a espetacular marcação e facilidade com que o Grêmio dominou a partida e criou situações de gol.
O time gaúcho repetiu a filosofia tática da seleção argentina -única do mundo que marca pressionando em todas as partidas. A França, que não usa o esquema com três zagueiros, alterna a marcação por pressão com o recuo e contra-ataque.
Os franceses são mais prudentes e racionais do que os apaixonados argentinos. Encantam menos, porém jogam com mais segurança.
O início da filosofia de marcação por pressão começou na Copa de 1974. Cruyff conta que, 15 dias antes do Mundial, o técnico holandês Rinus Michels reuniu os jogadores e resolveu fazer algo diferente, surpreendente, já que não dava tempo para treinar o trivial. Os treinadores comuns, normais, fariam o contrário. Os holandeses decidiram se divertir na Copa. E encantaram o mundo.
O técnico colocou a defesa, o meio-campo e o ataque bem próximos. Adiantou a marcação e congestionou o meio-campo. Quando o adversário ia dominar a bola, havia um bando de holandeses. Parecia uma pelada. Tomavam a bola e, com velocidade e habilidade, chegavam ao gol adversário. Até os zagueiros se transformavam em atacantes.
Uma deliciosa e eficiente loucura tática.
Acabaram a Copa e o sonho. Algumas equipes espalhadas pelo mundo tentaram imitar a Laranja Mecânica, mas não deu certo. Não conseguiam repetir a marcação. Levaram muitas goleadas. Era o fim da utopia e do futebol total.
No entanto, aquela gostosa loucura ficou no inconsciente coletivo do futebol. Era preciso recuperar o sonho, mesmo que distorcido. Há alguns anos, criou-se algo parecido.
Algumas equipes, como a Argentina, em vez de recuar e fechar os espaços defensivos, passaram a pressionar e marcar a saída de bola do adversário.
É um esquema de alto risco. Se a marcação for vencida no meio-campo, a defesa fica desprotegida. Para diminuir esse problema, é essencial um zagueiro na sobra. Outro problema é o cansaço. É impossível jogar dessa maneira durante 90 minutos. Se o time perder o primeiro tempo, terá muitas dificuldades em inverter o placar.
Para fazer bem essa marcação, são necessários treinos e a participação de todos os jogadores, inclusive dos atacantes.
Quando estão perdendo, os técnicos brasileiros correm para a lateral do campo para gritar e pedir a marcação na saída de bola. Não adianta. Os jogadores não têm o hábito de executá-la.
Essa postura independe do desenho tático. Pode-se utilizá-la com três ou quatro zagueiros. Como a maioria das equipes utiliza dois atacantes fixos, não é preciso mais do que uma linha com três zagueiros.
Antes da vitória do time gaúcho, Felipão disse que pretendia escalar três autênticos zagueiros, o que é bem diferente de recuar um volante no momento da jogada, como fazem os técnicos brasileiros.
O volante corre para trás e chega sempre atrasado. Os zagueiros estão de frente, olhando o passe, a bola e o atacante.
Parece que o Scolari mudou de idéia por causa da provável ausência do Antônio Carlos.
O zagueiro da Roma não é tão especial assim para a definição do esquema tático depender de sua presença.
Muito mais importante do que o desenho tático será a filosofia ofensiva ou defensiva do treinador. Se o time jogar com três zagueiros recuados, mais dois volantes na frente e os alas como se fossem laterais, terá oito defensores e dois atacantes isolados. É isso que fazem os técnicos brasileiros quando jogam nesse esquema. Viram o galo cantar e não sabem onde.
Sugiro que Felipão convide o Tite, técnico do Grêmio, para auxiliá-lo. Poderia, inclusive, ocupar a vaga do Antônio Lopes, já que a função de coordenador técnico é decorativa. A seleção ganharia um bom reforço.


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