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TONI NEGRI
O futebol está preso numa camisa-de-força
Eu ainda não sei, e ninguém até este momento
sabe, quem vencerá a Copa do Mundo. Nas previsões das
bolsas de apostas e dos "tifosi", a
eliminada Itália estava muito
bem. Mesmo o Campeonato Italiano, que alguma vez foi considerado "o mais belo do mundo",
é certamente hoje o mais feio.
Por quê? Porque é um futebol
que não tem mais uma identidade e uma personalidade, é um futebol no qual todos os jogadores
são iguais entre si, e, quando aparece algum diferente, acaba reduzido a ser como os outros.
Antes existiam os zagueiros da
classe operária, brutos, mas honestos. Existiam os meias velozes
que se moviam transformando o
campo em uma rede de possibilidades. Havia os atacantes que
surpreendiam pelo imprevisto.
E ainda tinha o líbero, que, de
sua posição, dominava tudo.
Abria o campo como a golpes de
foice, atravessando dezenas de
metros. Depois fechava seu campo como um gladiador, quando,
por acaso, por lá passava um atacante oponente.
Hoje, os jogadores são todos
iguais e valem a metade ou um
quarto daquilo que valiam os jogadores de um tempo atrás.
Não é por nada que os canais
esportivos preencham o tempo
com estatísticas, esquemas táticos
e replays. Eles precisam criar um
logo, uma marca para esses jogadores sem identidade.
A alternativa é entre o tédio e a
violência. O campeonato mais
feio do mundo só oferece isso. Há
compactos de partidas que são
tão repetitivas quanto ver o tráfego em uma rodovia. Mas há também jogos com tanta violência,
que chamam a atenção pela novidade e pela paixão.
Parecia impossível, mas, de verdade, se está realizando a profecia do horripilante filme "Rollerball", que vi anos atrás.
Disseram-me que, coincidindo
com a Copa do Mundo, o filme
entrou outra vez em cartaz em algumas repúblicas asiáticas, com
enorme sucesso.
É um cenário feroz, onde a cobiça dos dirigentes e dos bookmakers edifica a violência de um esporte circense, onde os jogadores,
para que siga o espetáculo, devem massacram uns aos outros.
Quando a alegria do jogo é
substituída pela busca do lucro
-e o resultado não é uma honra,
mas um investimento industrial-, o futebol fica feio.
O paradoxal consiste no fato de
o Campeonato Italiano ser um
dos paradigma mais importantes
do futebol mundial. Feio e violento, violento porque é feio e vice-versa.
Na democracia global do Império, esta forma de espetáculo entra como uma luva na era das comunicações. Às vezes, acho que
altíssima frequência de faltas e
contusões no jogo são provocadas
de propósito para permitir que
seja inserida uma propaganda
durante a partida. Sei que não é
verdade, mas os jogos são tão
chatos, que a inserção de publicidade acaba sendo uma coisa prazerosa.
O fato é que o futebol (o italiano e o mundial) está agora preso
em uma camisa-de-força, aquela
que o business e a publicidade determinam em torno de toda atividade humana.
Não há saída: o melhor para recuperar a magia do esporte é fechar os olhos.
Toni Negri, 69, filósofo italiano,
é autor de ""Império", entre outros
Tradução de Rodrigo Bertolotto
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