São Paulo, sábado, 20 de outubro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JOSÉ GERALDO COUTO

A magia e o acaso


Até quando o Brasil vai depender da sorte e dos lampejos de seus craques para impor seu futebol?

HOUVE VAIAS , houve festa, houve lances mágicos e uma penca de gols na vitória do Brasil sobre o Equador.
Além do mais, o Maracanã lotado é um espetáculo incomparável, sempre. Impossível pedir mais, não é verdade?
Não, não é verdade. É possível pedir muito mais, e em parte é para isso que estamos aqui. Muitas vezes o papel do crítico, comentarista ou cronista é o do estraga-prazeres, o do "aguafiesta", como dizem os espanhóis. Não estamos aqui para engrossar o coro dos contentes. Olhando friamente o jogo, vemos que o Brasil venceu porque foi, é e sempre será (a não ser na altitude de Quito) muito superior ao Equador.
Mas goleou meio sem querer, como decorrência do acúmulo de acasos de que é feito o futebol.
O primeiro gol, num primeiro tempo medíocre, saiu de uma bela jogada coletiva: passe de Robinho, Maicon supera o marcador, chega à linha de fundo, cruza para Vágner Love na pequena área. Tudo feito com objetividade e competência.
Esse seria o resultado, digamos, "lógico" do confronto: Brasil (superior, mas travado) 1 x 0 Equador (que aparentemente veio para empatar ou perder de pouco). Mas eis que entram em campo dois fatores decisivos e imprevisíveis: o talento individual e o mero acaso.
Kaká dá um chute ruim, que certamente iria para fora, mas, no meio do caminho, a bola encontra o pé de Ronaldinho, engana o goleiro e vai morrer no canto oposto.
O mesmo Kaká acertaria mais dois chutes de fora da área. Um deles preciso, no ângulo, sem defesa. Autêntico golaço. O outro tiro, meio despretensioso, fraco e no meio do gol, resultou num dos frangos mais espetaculares dos últimos tempos.
Kaká, constrangido, nem comemorou. Parecia mais inclinado a consolar o goleiro adversário. E houve, é claro, o lance luminoso de Robinho, um drible de futebol de salão que desconcertou o oponente e inventou um novo espaço em poucos palmos de chão. Depois de um desvio no meio da área (ah, o acaso), Elano mandou para as redes.
Ou seja, coletivamente, o Brasil construiu muito pouco. Continuamos dependendo da sorte e dos lampejos de nossos craques. Os próprios jogadores, pelo menos os mais conscientes, sabem disso. A prova é o constrangimento de Kaká, penalizado com o goleiro, e de Ronaldinho, que admitiu ter feito seu gol "meio sem querer".
Não tenho dúvida de que o Brasil vai se classificar para a Copa, provavelmente em primeiro ou segundo lugar. As eliminatórias sul-americanas são muito fáceis, comparadas às européias. Praticamente metade dos times do continente vão à Copa.
O dia em que o Brasil não se classificar será um escândalo planetário. Mas não custa muito, com o elenco de que dispomos, tentar formar uma equipe mais consistente e praticar um futebol mais desenvolto. E já que estou na linha da "crítica construtiva", eu pergunto: por que não se fala mais em Juninho Pernambucano? Será que ele tem menos futebol que Fernando, Elano, Josué ou Júlio Baptista? Será que o meio-de-campo brasileiro não ganharia mais fluência e poder de criação com um craque como ele?

jgcouto@uol.com.br


Texto Anterior: Federação lusa também multa Scolari
Próximo Texto: Corinthians pode ser o "melhor" rebaixado
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.