São Paulo, domingo, 24 de julho de 2005

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SANTO DE CASA

Moradores de Kerpen preferem futebol a corridas; ex-prefeito boicotou representante famoso do município alemão

Cidade onde piloto cresceu ignora o filho ilustre

FÁBIO VICTOR
PAULO COBOS
ENVIADOS ESPECIAIS A KERPEN

A placa com o limite de velocidade anuncia algo de esquisito. Na rua Kölner, a principal de Kerpen, os radares não permitem que se passe dos 30 km. É um alerta de que tudo na modorrenta cidadezinha seja discreto e devagar. Seria mais uma entre tantas cidadezinhas assim no oeste alemão, não fosse o fato, que torna a placa ainda mais bizarra, de que ali cresceu o piloto mais vencedor da história da F-1.
Michael Schumacher, nascido em Hürth-Hermülheim, lugarejo a cerca de 20 km, e criado em Kerpen, onde também começou a correr, é só um espectro ali.
Diferentemente do que se imagina quando se pensa no Brasil, não há idolatria nem euforia dos habitantes em relação ao ilustre filho da terra. Nenhum pôster, nenhum retrato, nenhuma manifestação que indique que aquela é a terra de Schumacher.
Ou quase nenhuma, já que há, no quintal de uma única casa, uma bandeirinha da Ferrari a tremular. E há a rua Michael Schumacher, inaugurada em 2000, quando o hoje heptacampeão ganhou o seu terceiro título. Dá acesso ao enorme e moderno kartódromo que o piloto construiu e que é administrado pelo seu pai, Rolf -que estava no local quando a Folha esteve lá, no mês passado, mas se recusou a dar entrevistas, alegando que parou de fazê-lo porque a imprensa já deturpou muito o que ele diz.
Mas, no núcleo central da cidade, que tem 20 mil habitantes (a "Grande Kerpen" reúne 50 mil), ninguém dá muita bola para o campeão, muito pelo fato de que é outro o esporte mais popular.
"Nós gostamos é de futebol. Aqui todo mundo torce para o Colônia, mas não há muito mais a fazer. As pessoas são como robôs, programados para rotina casa-trabalho, trabalho-casa. É como se fosse uma cidade-dormitório", diz Ayhan Gundogdu, 28, químico e tecladista da banda Emek, de ascendência turca como 10% da população.
O estudante Alexander Palantohen, 14, diz que o desdém com o campeão é muito culpa dele mesmo. "Nós gostamos do Schumacher, mas ele não liga muito para badalação, é muito na dele. Só vem aqui para visitar a família e mais nada."
"Como quase todo mundo aqui, prefiro futebol à F-1. E em segundo lugar corridas de kart", conta Alexander, que prefere o kartódromo de Schumacher ao outro, onde o campeão começou, pois este não aluga karts.
Mesmo no salão "Conny", onde o astro corta o cabelo, por 16 (R$ 46,5), o entusiasmo é pequeno. O único cliente na tarde de 23 de junho era Niklas Aussem, 14, acompanhado da mãe, Karin. Questionado se prefere F-1 ou futebol, o garoto não hesita em cravar a segunda opção.
Como toda regra, há em Kerpen uma exceção -ou quase. Um dos maiores fãs mundiais de Schumacher, que acompanha o piloto por toda a parte, sempre fantasiado com uma cartola com um bonequinho do campeão, Reiner Ferling, 53, vive numa cidade próxima. "É que, como ele já ganhou sete títulos, para o pessoal daqui é meio normal", interpreta ele, que fundou um fã-clube do piloto. Dos 250 integrantes, só 30 são de Kerpen.
A mulher de Reiner, Marita, tem outra avaliação, a de que boa parte da culpa é do ex-prefeito Ralf Valkysers, que deixou o cargo em dezembro passado.
"Ele se queixava que Schumacher não vinha muito aqui, então o retaliava. No ano passado, na corrida em que ele acabou sendo heptacampeão, estava programado um telão na rua e uma festa em seguida. Não teve porque o prefeito disse que esqueceu e foi a um torneio de xadrez."


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