São Paulo, quarta-feira, 24 de setembro de 2008

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TOSTÃO

O chefão e o escudeiro


Os ingleses estão curiosos e encantados com o estilo e com o personagem Felipão, que foge do lugar comum

MESMO DEPOIS de Felipão ganhar vários títulos, não entendia muitas de suas condutas e substituições. Mas geralmente davam certo. Isso me intrigava. Eu é que deveria estar errado.
Com o tempo, percebi que Felipão fugia do lugar-comum.
Ele não se enquadra nas clássicas teorias técnicas e táticas do futebol nem nas mesmices da maioria dos treinadores e comentaristas. Ele é melhor do que pensava, embora não concorde ainda com algumas de suas condutas.
Felipão não foi campeão várias vezes por sorte, por formar famílias bem comportadas e unidas nem por falar curto e grosso.
Além de seus bons conhecimentos técnicos, táticos e científicos, Felipão tem uma rara qualidade, importante em qualquer profissão, que é a de ver logo o que é essencial.
Não perde tempo nem enrola. Enxerga e toma decisões rápidas. Não é corajoso por etapas. Vai direto no que resolve. Quando é para retrancar, faz também para valer.
Ele se prepara para um jogo e estuda o adversário, como fazem todos os bons técnicos, mas não faz sempre o que foi programado.
Improvisa. Não é refém da prancheta. Une a razão com a emoção e com a intuição.
Diferentemente da maioria dos outros treinadores, Felipão gosta e pede a ajuda de um verdadeiro psicólogo. Tem consciência de suas limitações.
"A humildade não é o desconhecimento do que somos, e sim o conhecimento e o reconhecimento do que não somos."
Existe uma dúvida se o comportamento de Felipão é espontâneo ou marqueteiro. Não importa. Ninguém é só uma coisa ou outra. Acho que ele é muito mais espontâneo. Se não fosse, perderia o encanto.
Felipão continua o mesmo. No domingo, o Chelsea perdia por 1 a 0 para o Manchester United, que jogava melhor. O técnico colocou mais dois atacantes, adiantou a marcação e correu todos os riscos de levar mais um gol no contra-ataque.
Deu certo.
O Chelsea pressionou, empatou e só não ganhou porque o centroavante Anelka é muito ruim.
Os ingleses estão curiosos e encantados com o estilo, com o personagem Felipão e com a maneira carinhosa como ele trata os jogadores e o público. Antes da partida contra o Manchester United, ele ficou perto do campo, vários minutos, dando autógrafos para os torcedores.
Nunca vi um técnico inglês fazer isso. Nem brasileiro.
Tudo sob o olhar de seu fiel escudeiro. Murtosa é o auxiliar ideal. É discreto, não discute as ordens do chefe nem deseja seu lugar. Os dois se comunicam pela respiração, pelo olhar e pelos gestos.
A comunicação analógica, corporal, sem palavras, não é tão exata, mas é muito mais rica e completa que a digital. O corpo não mente.
Se o Chelsea ganhar a Copa dos Campeões da Europa, título que não tem, Felipão vai se tornar mais importante no futebol inglês e mundial do que já é.
Ele e Murtosa, que pode ser eleito o melhor escudeiro da história.
Mas se Felipão for mal e ainda mostrar seu outro lado, ditatorial, com suas agressões a repórteres e adversários, que conhecemos bem, qual será a reação dos ingleses?
A rainha não vai gostar.


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