São Paulo, terça, 25 de fevereiro de 1997.

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FEDERAÇÕES
MATINAS SUZUKI JR.
Sistema federativo impede melhoria dos campeonatos

Do Conselho Editorial

Um dos homens mais fortes da República, cujo pai quase foi presidente de um dos mais importantes times cariocas, foi quem melhor definiu o sistema de funcionamento das federações e da CBF.
Segundo essa alta autoridade do Executivo, elas repetem toda a estrutura perversa do sistema federativo das associações patronais brasileiras.
Os Estados têm, por exemplo, as suas Federações da Indústria (a Fiesp de São Paulo talvez seja a mais conhecida no Brasil).
E o país tem a Confederação Nacional das Indústrias. São representações baseadas em uma estrutura sindical rígida e uma contribuição obrigatória que não condizem mais com a modernização da economia brasileira.
Os presidentes de federações são eleitos pelos presidentes das ligas amadoras e dos clubes filiados. A participação dos sistema amador nas federações que lidam com futebol altamente profissionalizado, por exemplo, é uma das contradições que o sistema federativo brasileiro dá abrigo.
O presidente de federação é um pequeno déspota da época. Cria-se dentro das federações um regime clientelista na disputa e manutenção do poder.
Esse regime, em última instância, é punitivo para os grandes clubes e concessivo para os pequenos que acabam legitimando o poder do presidente.
Não raro, o poder diretivo de uma federação sustenta-se na aliança com os clubes pequenos e de divisões secundárias, aliados às ligas amadoras.
No Brasil, as federações organizam os campeonatos estaduais, elaboram as tabelas, escolhem os juízes, vendem os direitos de transmissão para a televisão, registram os clubes e jogadores e até dão o ``aval moral'' para a compra e venda de jogadores.
Há um excesso de atribuições, para as quais nem sempre estão preparadas. Muitas vezes, as decisões eminentemente técnicas para essas itens ficam resolvidas por critérios políticos.
O futebol vive um sistema fechado. Embora a Lei Zico, de 1993, torne livre o direito de criar federações, ligas ou associações, um clube isolado, ou um grupo de pequenos clubes não pode se rebelar contra as determinações do presidente de uma federação.
A federação tem o poder de desfiliar clubes que não cumpram os regulamentos. Um clube desfiliado fala sozinho: não pode participar nem dos campeonatos estaduais, nem dos Campeonato Brasileiro, pois a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) não reconhecerá esse clube.
A Confederação Brasileira de Futebol também já avisou que não reconhecerá os times que participam de federações ou ligas alternativas nos Estados.
Por sua vez, a Fifa, como entidade máxima do futebol internacional, também pode desfiliar federações, clubes e até impedir que seleções participem de competições internacionais.
Fica muito difícil romper o elo de poder na cadeia internacionalmente coercitiva do futebol.
Experiência européia
A experiência bem sucedida dos países europeus indica que o sistema federativo para o futebol de primeira linha foi superado.
Esses países têm uma instância superior (no Brasil, a CBF) que cuida das chamadas questões institucionais do futebol, mas que não administram a vida dos clubes e a organização dos campeonatos.
Nesses países, foram constituídas as entidades conhecidas como as ligas nacionais profissionais, que são organizações não-federativas, não vinculadas a interesses regionais, criadas pelos clubes para administrar e organizar os campeonatos de futebol em moldes profissionais e modernos.
Essas ligas perceberam o potencial do futebol no mundo do espetáculo e na indústria do entretenimento contemporâneo, a passaram a administrá-lo mais com o olho no mercado e no mundo dos negócios, do que no mundo das disputas políticas e regionais do sistema tradicional (que também havia em grande quantidade nos países europeus).
Ao contrário do Brasil, onde temos federações (na maioria) fracas para times fracos, as ligas européias são organizações fortes para times fortes.
Além da oposição política da CBF, o grande empecilho para a constituição da liga nacional de clubes no Brasil são as federações.
Com uma liga nacional, que papel restaria às federações estaduais? A resposta a esta questão esbarra em outra: com a liga nacional, que papel restaria aos campeonatos estaduais, base do poder político das federações?
Os cenários
A continuidade do regime federativo no futebol brasileiro dependerá dos rumos que o futebol brasileiro adotar nos próximos anos.
Há uma corrente bastante forte propondo a ampliação e valorização dos torneios nacionais (Campeonato Brasileiro e Copa do Brasil, basicamente), em detrimento dos campeonatos e torneios estaduais e regionais.
Se essa corrente prevalecer, o cenário com o encolhimento das federações e o surgimento de uma liga nacional de clubes profissionais aumenta as suas chances de aparecer nos horizontes do país do futebol.
Dependendo do regime a ser adotado, as federações administrariam os campeonatos regionais dos times excluídos das divisões da liga nacional.
Em outro regime, o da permanência dos torneios estaduais, só que em formato menor, elas continuariam administrando esses campeonatos.
No caso de prevalecer o terceiro regime, aquele que prevê a extinção pura e simples do campeonatos estaduais, seria difícil imaginar a subsistência das federações.
Mas, seja qual for a variante adotada para a modernização do futebol brasileiro, ela passará pela diminuição do poder das Federações.
É aí é que a coisa pega.

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