São Paulo, terça-feira, 25 de junho de 2002

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JOSÉ ROBERTO TORERO

Os dois lados da moeda, ou do Brasil


De certa forma, nossa competência no principal esporte do planeta mostra que podemos vencer em outras áreas


Econômico leitor, esportiva leitora, uma das experiências mais ambíguas que tenho vivido nas últimas semanas tem sido a leitura deste jornal. Poucas vezes lembrei-me tanto dos versos de um célebre soneto de Camões que dizem: "Em vivo ardor, tremendo estou de frio".
Abro o caderno Esporte e sou levado às alturas celestes: Rubens Barrichello vence uma corrida de ponta a ponta, Felipe Massa faz mais um pontinho, e a seleção brasileira fala em conter o triunfalismo, tanto que é considerada favorita para ganhar a Copa do Mundo.
Porém, quando abro o caderno Dinheiro sou lançado nas profundezas do inferno: a rolagem da dívida pública se configura como um problema insolúvel, o dólar dispara, as bolsas caem, e o tal de risco Brasil nos coloca na vice-liderança de uma Copa que tem como líder a desventurada Argentina.
Como devemos nos sentir? Tristes por estarmos nos apoiando numa felicidade passageira ou alegres por termos ao menos um motivo de contentamento em meio a essa crise que, se não é eterna, parece crônica?
Não sou um especialista em economia, mas às vezes penso que os economistas poderiam aprender ao menos um pouco com o futebol.
Nossa seleção vem se dando bem por vários motivos, mas um deles é o espírito de independência e mão firme da parte do técnico Luiz Felipe Scolari.
É verdade que, volta e meia, Scolari nos aborrece com sua teimosia, mas ninguém pode negar que o homem pensa no grupo, tem personalidade e determinação em aplicar suas idéias.
Por outro lado, o país vem se dando mal, entre outros motivos, por causa da subserviência dos representantes da área econômica. Com temor e tremor, obedecemos aos organismos internacionais, aplicando exatamente a receita por eles proposta. Resultado: não vemos melhora nem no desempenho da economia, nem nos índices sociais.
O ideal seria que em economia tivéssemos a mesma altivez que no futebol. De certa forma, nossa competência no principal esporte do planeta (apesar da corrupção dos nossos dirigentes) mostra que podemos vencer em outras áreas.
Enfim, torço para que chegue o dia em que, abrindo o caderno de Dinheiro, eu tenha a mesma sensação de quando abro o de Esporte: a sensação de que temos um técnico, temos um time e estamos caminhando em direção a algum lugar.

torero@uol.com.br



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