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BASQUETE
A condição humana
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
Não será por dinheiro.
Mesmo aposentado, contratos de publicidade, aplicações financeiras e produtos que levam
sua marca continuaram a jorrar
milhões de dólares. Ademais, seu
novo time já havia estourado a
folha salarial e só poderá lhe pagar US$ 1,3 milhão, migalha para
quem recebia 20 vezes mais.
Nem faz sentido imaginar uma
conspiração de patrocinadores.
Até seus parceiros mais fiéis já
praticavam novas estratégias de
mercado, cada vez mais afastados
do basquete. A Nike, por exemplo,
não se candidatou a fornecer material para o campeonato -o
contrato, de US$ 175 milhões e
dez anos, caiu no colo da arqui-rival Reebok há dois meses.
Tampouco há pressão dos cartolas. O mais recente plano de
marketing da NBA ignora veteranos como Ele. A ordem é priorizar
a promoção de jovens atletas e,
novidade, alguns "estrangeiros".
Não será por conta dos interesses das TVs. Igualmente colhidas
de surpresa, não haviam previsto
a exibição de nem sequer uma
partida de sua nova equipe -às
pressas, revêem as grades.
Nem por causa dos mais ardorosos fãs. Tanto que Ele secionaria laços de 15 anos com o clube e
a cidade que o projetaram -sairiam os Bulls e Chicago, entrariam os Wizards e Washington.
Não será para saciar a sede de
títulos. Senão, como explicar sua
opção por um saco de pancadas?
Faz 13 anos que o Washington
não passa à segunda fase do torneio. Na temporada passada, ganhou somente 19 das 82 partidas,
ficando 20 vitórias aquém da zona de classificação -e 50 da faixa a que Ele se acostumou antes
de pendurar os tênis de cano alto.
Não será por saudade dos colegas de glória. Afinal, não teria a
seu lado nenhum remanescente
do hexacampeonato -Phil Jackson agora comanda o Los Angeles, Scottie Pippen toca a vida no
Portland, Dennis Rodman e Luc
Longley se aposentaram...
Nem pela vontade de dar uma
lição nos sucessivos candidatos
que o basquete teimou em lançar
a seu trono -Ele reconhece que,
aos 38 anos, teria dificuldades
diante de dínamos como Kobe
Bryant, Vince Carter, Grant Hill,
Tracy McGrady e Allen Iverson.
Muito menos pela obsessão de
preservar o mito. Afinal, nenhuma legenda do esporte tinha se
despedido de forma tão consagradora -seu gesto de adeus foi a
cesta que deu, a 5 segundos do fim
do jogo, a sexta taça aos Bulls.
Ah, não se iluda, Ele sacudiria
cada célula de seu corpo para exceder em tudo isso -para levantar os Wizards, para buscar um
sétimo título, para superar os garotos valentões, para triunfar.
Afinal, Ele odeia ser derrotado,
despreza quem perde, não suporta a idéia de ser batido.
Mas, nos três anos distante das
quadras, Ele descobriu algo que
abomina ainda mais: não jogar.
Tem gente que madruga para
correr no parque. Ou que atrasa o
sono por causa da pelada com os
colegas de escritório. Que resolve,
de supetão, treinar feito louco para a São Silvestre. Que amassa bolinhas de papel até encestar no
balde de lixo. Que encara horas
de trânsito na estrada para pegar
uma dezena de ondas.
Fazem isso por prazer, para se
testar, para se sentir vivas.
Quando se afastou do basquete,
Michael Jordan era considerado
um Deus. Caso confirme hoje seu
retorno, mostrará que é também
um ser humano -que Ele, no
fundo, é ele. Aleluia.
Jordan 1
Acometido de uma tendinite nos joelhos, Jordan disse a jornalistas
que, de 1 a 10, considera ter atingido um nível 8. Muitos dirão que
80% de Jordan é melhor que 100% de quase todo mundo. Ainda assim, são 80% de Jordan. Não dá para esperar a mesma magnitude.
Jordan 2
Chris Whitney, Richard Hamilton, Kwame Brown e Jahidi White
completariam o time do Washington. Jordan atuaria como 3,
"small forward", e não como 2, "shooting guard". Para poupá-lo
na defesa, o técnico Doug Collins abusaria da marcação por zona.
Jordan 3
Compreensível, se a NBA fizer reverências. Mas não haverá moleza. Ron Artest, do Chicago, passou o recado nos jogos que o ídolo
organizou para readquirir a forma -insatisfeito com as piadinhas
de Jordan, o ala quebrou-lhe duas costelas com um soco.
E-mail: melk@uol.com.br
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