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FUTEBOL
Craques-que-não-foram: Pecente
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
Sabido leitor, saborida leitora, vocês devem conhecer o
tipo: ele jogava à beça quando era
apenas um garoto de oito anos, já
era brilhante aos 12 e genial aos
15. Todo mundo dizia que ele seria um jogador de futebol. E dos
bons. De seleção. O sujeito tinha
aquele raro talento que nós, os
pernas-de-pau, tanto invejamos.
Para ele o drible era fácil, e o gol,
uma rotina. Mas, por algum motivo, ele não se tornou um jogador
de futebol. Tornou-se um "craque-que-não-foi".
Há muitos deles por aí. Você deve conhecer alguns. Eu mesmo joguei com vários. Maionese era
um escorregadio ponta-direita.
Morreu num acidente de moto.
Orlando era um driblador genial.
Foi ser padre. Paulo Angolano era
um central de classe. Virou engenheiro.
Os craques-que-não-foram estão por aí. Muitos nem lembram
que nasceram com o dom e estão
acomodados em suas vidas. Mas
um ou outro suspira quando vê
um campinho e pensa que sua vida poderia ter sido outra.
Pois bem, por estes dias estava
eu lendo o mítico caderno de anotações de Pepe, onde ele tem todas
as suas partidas anotadas desde
os tempos de moleque, e vi que só
dois jogadores faziam mais gols
do que ele: Pelé, no profissional, e
um tal de Pecente, nos juvenis.
Fiquei curioso. Quem seria este
Pecente, capaz de fazer mais gols
do que Pepe, que marcou 430 e é o
22º maior artilheiro da história
do futebol nacional?
Pepe me contou que Pecente era
o apelido de seu amigo Pedro Vicente. Os dois jogavam juntos no
Comercial de São Vicente, e o técnico Lula, que naquele tempo cuidava das divisões de base do Santos, levou os dois para o infantil
do alvinegro.
Pecente era veloz, de passe rápido e chutava forte com a canhota.
Era alto. Tinha 1,79 m. Por isso
também jogava basquete. Nos
dois esportes, atuava como armador e pelos dois esportes foi campeão em 1954. Mas, segundo o
próprio Pecente, ele era melhor no
futebol do que no basquete.
O talentoso garoto seguiu nesta
bigamia esportiva por um bom
tempo, até que foi convidado para fazer uma excursão à Argentina pela seleção santista de basquete. A viagem de navio foi tão
boa que desequilibrou a disputa.
Na volta, Pecente disse aos dirigentes do Santos: "Vou parar um
pouquinho com futebol. Se não
der certo, eu volto". Deu certo e
nunca mais voltou.
Foi campeão brasileiro de basquete pela seleção paulista em 55,
56 e 57. Em 59, foi campeão mundial no Chile, na inesquecível seleção em que jogavam Wlamir,
Amaury e Rosa Branca.
"Eu sei que seria um bom jogador de futebol", diz Pecente. Mas
ele não acha que errou ao escolher o basquete. Pelo contrário.
"Foi sorte, porque ia chegar o Pelé, que jogava na mesma posição
que eu."
Pecente fez 71 anos no último
sábado. Hoje está aposentado e
mora em Piracicaba.
Poderia ter sido um grande jogador com a bola nos pés. Preferiu
usar as mãos.
E não se arrepende.
Caderno de Pepe
Os cadernos de Pepe citados no
começo desta coluna são impressionantes. Possuem as escalações de todos os jogos dos
quais ele participou como jogador e técnico. Todos os resultados e os autores dos gols. Daria
para fazer um livro com o tal
caderno. E está sendo feito. A
autobiografia de Pepe, recheada de histórias engraçadas, deve sair em abril, no aniversário
do Santos.
Próximo
Na próxima semana contarei a
história de outro "craque-que-não-foi". Seu apelido era Maninho e trata-se do sujeito que tabelava com Pelé no Baquinho, o
time da infância do Rei. Valdemar de Brito, que levou Pelé para o Santos, indicou-o para o
Palmeiras e disse que ele seria o
ponta-direita de sua seleção.
E-mail torero@uol.com.br
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