São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

África negra se abraça por ganenses

Único representante do continente ainda na Copa do Mundo recebe apoio de políticos e de atletas de países vizinhos

Camaroneses Milla e Eto'o irão ao estádio; Kofi Annan, secretário-geral da ONU, telefonou para astro do time para parabenizá-lo


DO ENVIADO A DORTMUND

Cenário tão desejado quanto infrutífero nas últimas décadas, a unidade dos países africanos em torno de um projeto comum para o continente parece palpável nos dias da Copa.
Numa região devastada por guerras, rivalidades regionais e brigas entre vizinhos, o futebol mais uma vez se apresenta como instrumento conciliador. Pode até soar como demagogia, mas a África negra se mostra abraçada para torcer por Gana.
São aguardados hoje no estádio de Dortmund craques e ex-craques do continente, numa repetição do que ocorreu antes da vitória de Gana sobre os EUA, que definiu a classificação do time às oitavas-de-final.
Naquele dia os camaroneses Roger Milla e Eto'o, aquele a maior estrela do futebol africano nos anos 1990, este um dos destaques de hoje, fizeram discursos de apoio aos colegas. Juntaram-se a ex-craques de Gana, como Abedi Pele.
A festa africana para Gana começara já na convincente vitória sobre a República Tcheca, mas a euforia cresceu com os 2 a 1 sobre os EUA, muito pela classificação, claro, mas parte também pela impopularidade que o adversário possui em boa parte do continente.
"Recebemos ligações de Senegal, do Togo, da Nigéria, de Camarões. Nessa hora não somos rivais, isso é a força do futebol. E saber que estamos representando toda a África é nossa maior motivação", afirmou o meia e capitão Appiah, repetindo um discurso que se tornou banal nos últimos dias.
A presidente da Libéria, Ellen Sirleaf-Johnson, mandou uma mensagem aos Estrelas Negras e disse que iria tirar folga hoje para torcer por Gana.
Um dos africanos mais influentes, o ganense Kofi Annan, secretário-geral da ONU, telefonou para Appiah para parabenizá-lo. Telegramas de políticos da região têm sido encaminhados ao presidente de Gana, John Kufuor, que enviou o seu ministro de Educação, Esportes e Ciência, Owusu Ankomah, para acompanhar o time.
"Para um país africano, participar de uma Copa do Mundo é um acontecimento raro. Apesar disso, nenhum de nós tem ido muito longe. Quando isso acontece, eles vêm aquele time representar todo o continente", afirmou Ankomah à Folha.
"Sim, há muitas rivalidades e problemas. Mas, quando o assunto é esporte, isso tudo some", acrescentou o político.
Um dos sinais disso é o fato de que Togo, um vizinho com quem os ganenses já travaram escaramuças, tem demonstrado apoio à "causa" de Gana.
Appiah contou que, entre os jogadores que lhe telefonaram para prestar apoio estavam os togoleses Adebayor e Kader, cuja seleção caiu na primeira fase do Mundial. Didier Drogba, astro da também eliminada Costa do Marfim, fez o mesmo, segundo o capitão de Gana.
Nascido em Acra, capital de Gana, o ex-zagueiro Desailly, que defendeu a França nas Copas de 1998 e 2002, também prometeu ir a Dortmund hoje torcer pelos Estrelas Negras.
Entre os jornalistas do continente que acompanham a seleção de Gana na Alemanha, impera um espírito de torcida.
O clima de solidariedade é semelhante ao que se viu na Copa da Ásia-2002, quando Senegal surpreendeu o mundo ao derrotar a Suécia nas oitavas-de-final e avançar às quartas -seria eliminado pela Turquia.
Mas é importante ressaltar que o apoio está localizado na África negra subsaariana, não encontrando a mesma abrangência no norte do continente, do qual é separado por uma espécie de fronteira cultural invisível. (FÁBIO VICTOR)

Texto Anterior: Soninha: Nada é pra sempre...
Próximo Texto: Análise: Os brasileiros da África
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.