São Paulo, sábado, 28 de setembro de 2002

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MOTOR

O plebeu da F-1

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

Pouco antes do GP do Canadá, Schumacher resolveu fazer valer a travessia do Atlântico. Foi para Dallas, visitar uns amigos. E aproveitou o tempo livre para visitar o Texas Motor Speedway, aquele oval que foi abandonado em pleno treino pela Indy porque os pilotos vomitavam e reclamavam de dores de cabeça.
No circuito funciona uma escolinha de automobilismo. O dono do negócio se chama Mike Starr, cobra US$ 100 para ceder um carro de Nascar para o cidadão se divertir, dar umas voltas na pista.
Schumacher, então, pagou os US$ 100 e esperou duas horas na fila. Tem gente que jura que o alemão deu as suas voltas, mas ontem ele negou, disse que esperou tanto tempo que acabou desistindo. Segundo consta, naquele dia havia mais de cem pessoas no autódromo. Schumacher, um dos maiores pilotos da história, então "apenas" tetracampeão mundial de F-1, um dos esportistas mais bem pagos do planeta, passou despercebido. "O que me deixou mais surpreso foi que ninguém me reconheceu", contou o agora o pentacampeão e natural candidato ao sexto e inédito título.
Sarona Winfrey, relações públicas do autódromo, lançou a seguinte pérola ao "Indianapolis Star": "Se fosse o Jeff Gordon ou o Rusty Wallace, certamente seria reconhecido". Acredito que poucas pessoas por aqui reconheceriam ou ao menos saberiam quem é Rusty Wallace -isso só comprova o hermetismo do automobilismo norte-americano e torna plausível o anonimato do melhor piloto da atualidade.
O incrível da história, no entanto, é o alemão se submeter a um programa de turista para andar em um carro de Nascar -com um telefonema, conseguiria um dia inteiro de teste em qualquer equipe da categoria e sem que ninguém ficasse sabendo.
Claro, mais uma que entra no rol já folclórico que Schumacher acumula em sua carreira -guardar moeda nacional por um ano entre dois GPs Brasil (em tempos brabos de inflação), atravessar a fronteira entre Suíça e Alemanha para pagar menos por um pote de geléia, tirar rachas na ruas de Buenos Aires com Villeneuve, encher a cara de cerveja no Japão.
Nesses momentos parece prevalecer o Schumacher que poucos conhecem, o sujeito que gosta de carro e futebol como qualquer alemão da classe média baixa, distante da figura do esportista rico, perfeccionista, embaixador da ONU, dedicado pai de família.
Um Schumacher mais próximo talvez daquele desenhado insistentemente pelo grande número de críticos que coleciona, os que cobram espírito esportivo e gestos nobres e o descrevem como petulante, mal-educado, arrogante. É óbvio que o alemão fez uma série de bobagens na carreira e deverá fazer ainda mais, não se considera corrigível, mas é fato que muito do que pesa contra ele tem fruto no caráter aristocrático da categoria. A elite se reconhece em qualquer língua. Senna, entre outros, fez barbaridades e não foi cobrado tanto por isso. Não veio de baixo, longe disso. Schumacher, pelo contrário, teve que se justificar. Fez isso na pista, e o resultado é esse que está aí.
Em tempo, ele explicou também ontem porque não se identificou como o grande piloto do resto do planeta para garantir as voltas com o stock no Texas. "Se contasse quem eu sou, talvez me colocassem na frente da fila. Mas ia parecer muito arrogante."

E agora?
Com Barrichello precisando de apenas três pontos para garantir o vice-campeonato, a Ferrari liberou o brasileiro e Schumacher para uma corrida franca amanhã. Será a primeira da temporada.

Volta?
A Sauber diz que Massa volta para a última corrida do ano, em Suzuka. Em Indianápolis, pouca gente do paddock acredita nisso.

Fantasma
A Arrows não corre desde Hockenheim, mas sua megaloja de merchandising continua indo às corridas. E até para Indianápolis.

Nascar
Christian faz mais uma corrida pela Bush Series, hoje, no oval de Kansas. Ontem, o piloto, que assinou contrato de três anos com a Petty Racing, conseguiu classificar seu Chevrolet na 32ª colocação.

E-mail mariante@uol.com.br



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