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Os vices são os últimos
JOSÉ ROBERTO TORERO
da Equipe de Articulistas
Esse ano foi o ano dos vices. O
Brasil foi vice na Copa do Mundo, o Vasco foi vice-campeão
mundial, e talvez hoje o Cruzeiro se transforme num trivice,
chegando em segundo na Copa
do Brasil, no Campeonato Brasileiro e na Mercosul.
Pensando sobre isso, fiz-me
uma filosófica pergunta: "Há
coisa pior do que ser vice?".
Como não havia ninguém por
perto, eu mesmo me respondi:
"Não, nada é pior do que vice."
Um racional ortodoxo poderia
dizer que ser vice não é assim
tão ruim; que ser terceiro, quinto ou 19º é muito pior.
Mas seria raciocínio de economista, não de torcedor.
O torcedor, melhor conhecedor dos labirintos da alma, sabe
que o vice é a pior colocação
possível.
O terceiro colocado passa sempre por um esforçado de futuro,
do quinto se diz que fez um bom
trabalho de base, e o décimo nono fez milagres para não cair
para a segunda divisão.
Todas as outras colocações recebem algum elogio, menos o vice. O pobre segundo colocado
talvez seja o único derrotado
nas competições. E, mesmo que
não seja o único, certamente é o
maior de todos. Ainda mais
quando há uma final de campeonato, um duelo decisivo.
Os outros participantes são
apenas os outros participantes.
O vice não.
O vice é aquele que perdeu,
aquele que foi vencido.
Foi ele que chegou até o último degrau e escorregou, foi que
ele que chegou até os portais da
glória e esqueceu a chave.
Para o vice não há consolo e,
muitas vezes, nem perdão.
Várias imagens passavam pela minha cabeça para simbolizar o que é ser vice.
Deixo duas aqui na tentativa
de melhor definir essa tortura,
esse suplício, esse flagelo do espírito:
1) Um náufrago está à deriva
durante semanas, sem ter o que
comer nem beber, apenas
apoiado num pequeno pedaço
de madeira e castigado pelo sol
inclemente. Ele então, como por
milagre, vislumbra uma praia
paradisíaca. Ela está a menos
de cem metros. Daqui a algumas braçadas ele poderá até tocar os pés no chão. Lágrimas
salgadas como o mar caem dos
seus olhos. Ele está feliz, quase
em êxtase. Mas aí aparece um
tubarão...
2) O pára-quedista salta. Porém, como que amaldiçoado pelos deuses, seu pára-quedas não
abre. Ele vê o chão se aproximando rapidamente e já pode
imaginar seu corpo transformado num mórbido quebra- cabeça. É então que ele se lembra do
pára-quedas reserva. Ele puxa a
alça ao mesmo tempo em que
reza um Pai Nosso. Funciona!
Em poucos segundos, o pára-
quedista está descendo lentamente, embalado por uma leve
brisa. Ele encontra até tempo
para observar a paisagem. Um
sorriso de prazer e alívio está
em seu rosto. Porém ele repara
que está pousando dentro de
um pequeno zoológico. Para seu
azar, bem na jaula do leão. E o
leão está faminto.
Enfim, ser vice é como ver um
belo pôr-do-sol e queimar a retina, é ter a felicidade ao alcance
da mão e ser maneta, é viver
num harém, mas ser apenas um
eunuco.
Pobres dos vices.
Felizes daqueles que ficam entre o décimo e o vigésimo lugar,
sentados na cômoda espreguiçadeira da mediocridade.
José Roberto Torero escreve às terças-feiras e
aos sábados
E-mail torero@uol.com.br
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