São Paulo, segunda-feira, 04 de abril de 2005

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William Faulkner é pauleira

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR

Você veria futuro para alguém com as seguintes características: na família, ninguém o via como especialmente inteligente; na escola, fez só até o segundo ano do ensino médio; graças a um programa especial para ex-militares, cursou alguns meses de faculdade, mas tirou notas medíocres; não tinha nenhum amigo intelectual -na verdade, tinha poucos amigos plenamente alfabetizados.
Sabe quem é o dono do currículo? Ninguém menos que o americano William Faulkner, Nobel em 1949, o inovador mais radical da literatura dos EUA no século 20.
Esses detalhes da vida de Faulkner estão em um lindo artigo do escritor sul-africano J. M. Coetzee (Nobel em 2003) no semanário "The New York Review of Books". Quem me indicou o texto foi o chapa Cassiano Elek Machado, da Ilustrada (ao contrário do Faulkner, eu tenho amigos intelectuais!).
Para Coetzee, Faulkner não precisava de educação formal, porque era um leitor obstinado, conhecedor de poesia inglesa, de Shakespeare e também da ficção de Balzac, Dickens e Conrad, do Velho Testamento e de seus contemporâneos T.S. Eliot e James Joyce. Para o tipo de escritor que Faulkner pretendia ser, aponta Coetzee, isso era o bastante.
Enquanto lia o artigo, me lembrei de uma "Escuta Aqui" de semanas atrás, sobre imitadores brasileiros de outro escritor americano, Hunter S. Thompson, que se suicidou há algumas semanas. A coluna era sobre a baixa qualidade literária dos clones brazucas, cujo trabalho dá a mais nítida impressão de que nunca leram nada, nem do próprio Hunter, justamente o cara que pretendem copiar.
A biografia de Faulkner tem muito a ver, também, com a de Albert Einstein, uma mente poderosa que nunca brilhou no universo escolar (era um aluno mais ou menos, péssimo em humanas, de família sem tradição intelectual etc.). Ninguém diria que o menino de inteligência aparentemente mediana se tornaria o nome mais importante da ciência no século 20.
Não tenha pressa para conhecer a obra de William Faulkner. Vá amadurecendo seu gosto aos poucos, porque Faulkner é pauleira.
Dá saltos de tempo, troca de narrador sem avisar, dá o mesmo nome a personagens diferentes, reproduz a linguagem falada de brancos e negros do Sul racista dos EUA sem a menor consideração pelo leitor.
Meu livro preferido dele é "The Sound and the Fury" ("O Som e a Fúria"). Um dia, também será o seu.

CD PLAYER

PLAY - "Lullabies to Paralize", Queens of the Stone Age
Sobrou só o Josh Homme, e basta. Ele domina um heavy metal nervoso, aflito, cantando quase sempre em falsete.

PLAY - "Employment", Kaiser Chiefs
Essa novíssima inglesa conseguiu o que os Libertines só tentaram: imitar o Clash direitinho.

EJECT - Bandas gaúchas reunidas em show acústico
Nem o diretor Wes Craven e o escritor Stephen King juntos atingiriam esse nível de horror.


@- cby2k@uol.com.br



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