São Paulo, segunda-feira, 26 de setembro de 2005

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Irmão mais velho é um herói

SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL

Anos 70, vizinhança do Aeroporto, São Paulo. Tinha 12 anos, era um dos melhores alunos de português do Externato São Paulo (pelo menos segundo a tia Rita), passei o ano planejando "pedir em namoro" uma menina sardenta chamada Marina, filha da professora de história. Bom de corrida, terrível em futebol, o que me levava sempre ao gol, apesar de eu ser o irmão mais novo de um craque, que a turma da rua chamava de Tanaka, porque quando ele ria os olhos fechavam "que nem japonês" -por tabela, eu era o Tanakinha.
E era sempre "o Tanakinha pega no gol". Um dia, Sérgio Alexandre, que não jogava bola, me deu um banho de Tubaína na porta do armazém do seu Nicola. Por nada. Banho de Tubaína, coisa humilhante, que vinha depois de bem chacoalhado o casco escuro, o dedão segurando o gás para liberá-lo na hora certa, na cara da vítima.
A vítima era eu. Sérgio Alexandre tinha dois ou três anos mais que nós, eu, o Marcos Munhoz, os outros pirralhos. E era uns 20 quilos mais gordo. Todos recuamos, calados. Mas eu tinha um trunfo na manga. Meu irmão mais velho. Quem tem irmão mais velho nunca está sozinho. Cheguei em casa chorando, ele perguntou por que, sumiu cinco minutos, voltou e disse "tudo resolvido". Depois daquele dia, Sérgio Alexandre me via e atravessava a rua, de medo -e respeito.
Luís namorou primeiro, levou primeiro a namorada para dormir em casa, fumou primeiro, fez outras coisas que não posso publicar aqui primeiro. Quando chegou minha vez, as portas já tinham sido arrombadas por ele, com briga, às vezes, diplomacia, de vez em quando, uma boa conversa, sempre (ele era -é- bom de conversa). Quem tem irmão mais velho tem um herói para o resto da vida.


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