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Irmão mais velho é um herói
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
Anos 70, vizinhança do Aeroporto, São Paulo. Tinha 12
anos, era um dos melhores
alunos de português do Externato São
Paulo (pelo menos segundo a tia Rita),
passei o ano planejando "pedir em namoro" uma menina sardenta chamada Marina, filha da professora de história. Bom de corrida, terrível em futebol, o que me levava sempre ao gol,
apesar de eu ser o irmão mais novo de
um craque, que a turma da rua chamava de Tanaka, porque quando ele ria
os olhos fechavam "que nem japonês"
-por tabela, eu era o Tanakinha.
E era sempre "o Tanakinha pega no
gol". Um dia, Sérgio Alexandre, que
não jogava bola, me deu um banho de
Tubaína na porta do armazém do seu
Nicola. Por nada. Banho de Tubaína,
coisa humilhante, que vinha depois de
bem chacoalhado o casco escuro, o dedão segurando o gás para liberá-lo na
hora certa, na cara da vítima.
A vítima era eu. Sérgio Alexandre tinha dois ou três anos mais que nós, eu,
o Marcos Munhoz, os outros pirralhos. E era uns 20 quilos mais gordo.
Todos recuamos, calados. Mas eu tinha um trunfo na manga. Meu irmão
mais velho. Quem tem irmão mais velho nunca está sozinho. Cheguei em
casa chorando, ele perguntou por que,
sumiu cinco minutos, voltou e disse
"tudo resolvido". Depois daquele dia,
Sérgio Alexandre me via e atravessava
a rua, de medo -e respeito.
Luís namorou primeiro, levou primeiro a namorada para dormir em casa, fumou primeiro, fez outras coisas
que não posso publicar aqui primeiro.
Quando chegou minha vez, as portas
já tinham sido arrombadas por ele,
com briga, às vezes, diplomacia, de vez
em quando, uma boa conversa, sempre (ele era -é- bom de conversa).
Quem tem irmão mais velho tem um
herói para o resto da vida.
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