São Paulo, segunda-feira, 26 de setembro de 2005

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FICÇÃO

CAFÉS PEQUENOS

Fernando Bonassi

Um irmão menor é a maior das conseqüências ocasionais das permanentes sacanagens de nossos pais.
O problema é que o irmão pequeno tende a ocupar demais o lugar marcado e paparicado que antes havíamos ocupado, entre os seios esplêndidos da jovem "mátria" amada e os abraços apertados dos braços musculosos do velho progenitor. Aliás, um irmão menor tem as suas pequenas vantagens, pois permite experimentar as doçuras e loucuras da paternidade, sem a obrigatoriedade de bancar um orçamento familiar.
Acontece que um irmão pequeno é um tormento causador de dores e despesas espetaculares para o lar! São terríveis os problemas imobiliários para administrar: dividir quartos empetecados, rachar armários atulhados, partilhar perfumes viciados e agüentar vencidos chulés...
Um irmão pequeno é o que é: um minúsculo pelo encravado no centro do saco cheio. Um irmão menor está no meio! São choros melosos, quereres escamosos, narinas entupidas e noites mal dormidas para todos os envolvidos.
Quem tem um pequeno irmão tem sempre uma ou outra questão pra resolver, uma lição de casa pra ajudar, uma criancinha pra divertir ou um pirralho pra azucrinar, essa é que é a verdade... Um irmão pequeno não passa de um caco pelado plantado no seu álbum de retrato, um bife a menos no prato e certeza da bagunça se instalando à mesa.
Um irmão pequeno é um pequeno argumento e uma grande confusão, mas também é a profissão da fé de dar proteção ao que padece em crescimento.
Crescer é difícil, já sabemos; mas eles nem têm noção!
São aquelas piadas sem graça contadas pra rimos da nossa própria cara escarrada!
Tem algo, no entanto, que requer ainda mais da sua atenção: quer queríamos, quer não, um irmão pequeno é a maior chance que temos de sobreviver à nós mesmos e à burrice de crescermos esquecendo do que fomos: delicados, agitados, esquisitos e divertidos, entre outros atributos mais ou menos malucos.
Um irmão menor pode nem ser o melhor dos remédios na situação, mas haverá de espantar a covardia e o tédio da solidão.

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