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MATEMÁTICA
Será que existem moedas e dados honestos?
JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Nada mais intuitivo do que admitir como 50% a probabilidade de obter cara no lançamento
de uma moeda, correto? Pois
bem, em certa ocasião, o matemático inglês John Kerrich teve a paciência de lançar uma moeda 10
mil vezes e anotar todas as ocorrências. Ao final do experimento,
ele registrou um total de 5.067 caras e 4.933 coroas, ou seja, uma
probabilidade de ocorrência de
cara igual a 50,67%. Como a probabilidade era calculada a cada
novo lançamento, Kerrich observou ainda que os registros indicaram exatamente 50% de caras
apenas três vezes ao longo dos 10
mil lançamentos. Será que os resultados de Kerrich contrariam
nossa expectativa inicial de 50%?
Em estatística, dizemos que um
fenômeno é randômico se sua
ocorrência é incerta em casos individuais, mas segue um padrão
para um número muito grande de
registros. Um fenômeno randômico expressa, portanto, um certo tipo de ordem, que emerge de
um número muito grande de observações. O lançamento de uma
moeda é um exemplo de fenômeno randômico: não podemos dizer o que ocorrerá em um só lançamento, mas podemos detectar
um padrão se fizermos um número muito grande de lançamentos.
Analisando o experimento de
Kerrich em um gráfico, é fácil observar que o aumento do número
de registros aproxima a probabilidade de ocorrência de cara do valor apontado pela nossa intuição.
Essa aproximação poderia ser
ainda melhor, não fosse o fato de
uma moeda usual não constituir
um objeto idealmente honesto (a
massa de uma face não é idêntica
à da outra). Quando nos referimos à moeda ou a um dado "honesto" em problemas de probabilidade, admitimos uma situação
ideal para conduzir o estudo de
um fenômeno randômico.
Os dados usados nos cassinos
são um bom exemplo de refinamento na busca desse objeto "honesto". Nesses dados, os furos feitos para a marcação dos números
são preenchidos com material da
mesma densidade do dado (e cor
diferente) para que não haja diferença de massa entre as seis faces.
Enquanto em um modelo ideal de
dado honesto a probabilidade de
ocorrência de qualquer face é
16,6%, em um dado com furos, a
face do número 1 (mais leve que a
do número 6) tem probabilidade
de 15,9% contra 17,5% do número
6, segundo dados experimentais.
José Luiz Pastore Mello é licenciado
em matemática e mestrando em educação pela USP.
E-mail: jlpmello@uol.com.br
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