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GRAMÁTICA
O critério na linguagem é a adequação
ODILON SOARES LEME
ESPECIAL PARA A FOLHA
A atriz estava sendo entrevistada. A uma pergunta ou comentário do entrevistador, ela
responde: "Quando você tem o
apoio do marido durante a gravidez, você pode...". Todo mundo
entendeu e, provavelmente, só os
mais exigentes estranharam.
Isolada, porém, do contexto, e
fora da situação em que foi proferida, a frase oferece motivo de estranheza. O entrevistador tem
marido? Pode engravidar? Tudo
por causa daquele você.
É comum, nos vestibulares, a
banca transcrever uma frase desse
tipo e pedir duas operações para
testar competências: a) indicar
traços de coloquialidade; b) reescrever a frase segundo as exigências da norma culta.
O pressuposto é que a língua
não é uma entidade homogênea.
Existem as variantes lingüísticas e
existem os níveis de linguagem,
cada um com suas características
próprias. Não é difícil perceber diferenças no modo de falar o português em diversos países (Brasil,
Portugal, Angola) e em diversas
regiões do mesmo país. Há também variações que se verificam
em função do tempo. Compare-se, por exemplo, o português de
um soneto de Camões com o de
um poema de Arnaldo Antunes.
O português se modifica, também, em função do nível social do
falante, ou da situação em que se
faz uso da língua.
A questão é de adequação. Numa situação em que se espera
uma linguagem formal, é inadequado usar palavras ou expressões que pertencem a outro nível
de linguagem, como a gíria.
A finalidade do vestibular é verificar, em primeiro lugar, o domínio que o candidato tem da
modalidade de linguagem chamada de padrão culto do português escrito contemporâneo. O
que se quer saber é se o candidato
domina esse dialeto privilegiado
chamado norma culta.
Isso não significa preconceito
em relação aos outros níveis
de linguagem. Pelo contrário. Espera-se que o candidato, além
do domínio da norma culta, tenha
capacidade e sensibilidade
para apreciar a beleza e a expressividade de outras modalidades da
língua.
Na linguagem coloquial, é
normal o uso do você como pronome indefinido, significando alguém ou uma pessoa não especificada. Então, nessa modalidade,
pode-se perfeitamente dizer a um
homem: "Quando você tem o
apoio do marido durante a gravidez, você pode..."
Odilon Soares Leme é professor do Anglo, responsável pela vinheta "S.O.S. Língua Portuguesa", da rádio Jovem Pan, e
autor de "Tirando Dúvidas de Português" e de "Linguagem, Literatura, Redação" (Editora Ática)
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