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CINEMA
CCBB exibe a partir de hoje documentários inéditos no país sobre perfis de cineastas incluindo produção com 40 diretores
Legado de Lumière é tema de mostra
TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA
Em dezembro de 1994, às vésperas do centenário do cinematógrafo, o crítico, ator e cineasta André Labarthe escreveu um artigo
para o jornal francês "Le Monde"
em que dizia que o século do cinema consolidara o triunfo de (Thomas) Edison, isto é, do comércio,
mas também tivera o seu "parêntese Lumière".
Trinta anos antes, Labarthe
criara com a viúva do crítico André Bazin (talvez o primeiro a
procurar, na história do cinema, a
descendência de Lumière), Janine, o projeto "Cinéma de Notre
Temps", famosa série de perfis de
cineastas que é o essencial da
mostra "Lumière e Companhia
- Cinedocumentos", que se inicia
hoje no Centro Cultural Banco do
Brasil de São Paulo.
O programa-piloto do projeto
foi uma longa entrevista de Truffaut com Rossellini, de quem o
francês foi assistente durante dois
anos em que o socrático mestre
neo-realista nada produziu.
Rossellini já era um descendente inequívoco de Lumière, mas foi
a geração de Truffaut e Labarthe,
a da nouvelle vague, a primeira a
se ver numa filiação, a primeira a
reivindicar o seu lugar no "parêntese Lumière" da história do cinema.
"Somos filhos de Lumière!",
bradava Godard quando a sua geração ainda não passava de uma
"escola" de curtas-metragistas.
Na Cinemateca de Henri Langlois, essa geração aprendeu que
os irmãos Lumière foram, de certa forma, os últimos dos impressionistas. Era o que sustentava o
mestre Langlois, tema de um dos
melhores documentários da mostra, que costumava identificar nos
filmes de Lumière os mesmos
motivos dos pintores impressionistas. É nesse sentido que Renoir
representava para essa geração a
figura de um patrão, como sugere
Rivette, outro "cinefilho" da nouvelle vague, no documentário
"Jean Renoir, Le Patron". Não
apenas por ter crescido entre os
impressionistas, mas também por
ter aberto, junto a Jean Vigo, nos
fundamentais anos 30 da cinematografia francesa, esse "parêntese
Lumière".
Com a ajuda do produtor de Renoir, Pierre Braunberger, a geração de Rivette pôde dar continuidade ao legado, lançando-se às
ruas de Paris para realizar seus
primeiros curtas em 16 mm.
Ao mesmo tempo em que procuravam livrar o cinema francês
da tirania e do enclausuramento
dos estúdios, os jovens da nouvelle vague queriam retomar a leveza e a inocência dos primeiros
tempos, a inocência de Lumière
(homenageada por Truffaut no
curta "Les Mistons") e a leveza
dos impressionistas.
"Os filmes da nouvelle vague
traziam esse maior frescor, mesmo nas anedotas e nas histórias,
que trouxera o impressionismo.
Uma forma de "lavar o olhar'", diria Rivette mais tarde ao crítico
Serge Daney, num documentário
da série que, ao lado dos especiais
sobre Bresson e Pasolini, são as
grandes ausências da mostra.
A prova Rivette dá em sua participação no documentário "Lumière e Cia", a grande atração da
mostra, projeto do Museu de Cinema de Lyon que convenceu 40
cineastas do mundo inteiro a filmarem, com a câmera-relíquia
usada há mais de cem anos pelos
irmãos Lumière, um curta de 52
segundos cada.
LUMIÈRE E COMPANHIA -
CINEDOCUMENTOS. Mostra com sete
documentários sobre cinema. Onde:
CCBB (r. Álvares Penteado, 112, SP, tel.
0/xx/11/3113-3651). Quando: de hoje a
12 de maio; hoje, às 15h ("Lumière e
Companhia") e às 17h ("Um Retrato de
Alain Resnais"). Quanto: gratuito.
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