São Paulo, quarta-feira, 01 de agosto de 2001

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"Político é político, artista é artista"

GERALD THOMAS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Fazia uns oito anos que não nos víamos, desde "O Sorriso do Gato de Alice", um show polêmico de que fui diretor e parceiro.
Ultimamente, tenho lido coisas injustas a respeito dela. O fato de ter apoiado um amigo, ACM, repercutiu como apoio político. Pena, porque Gal Costa é um nome acima de qualquer suspeita. Tem uma história, um currículo que a coloca junto às figuras mais importantes do país.
Queria reintroduzir, nesta entrevista, a grande diva da MPB. Sua arte está na voz, no sorriso e nos gestos peculiares e mais que imitados. Ela não deve ser julgada por nada, a não ser por sua obra. Leia trechos, a seguir.

Gerald Thomas - Eu tenho recomendação da Redação para falar do evento. Antes vou fazer uma introdução. Acho que você não tem a menor necessidade de ser uma pessoa política. A política é uma coisa nojenta. Você foi pessoal, amorosa. Se acusam, são todos encarapuçados, porque o ACM não é o último dos últimos. Esse é meu comentário. Qual é o seu?
Gal Costa -
Bom, deram uma cotação desmedida à minha atitude, de ir encontrar ACM, porque houve um mal-entendido. Eu não sei por que, se foi proposital ou não. Eu fui encontrar ACM naquele dia em Salvador, no palácio Ondina, não para dar o meu apoio ao ato político do homem, mas para dar meu apoio moral a uma pessoa que fez muito pela cultura da Bahia.

Thomas - Falam-me que este é o melhor disco da sua carreira. Eu quero que você fale...
Gal -
É, eu quero deixar uma coisa clara, eu vou voltar ao assunto Antonio Carlos: não foi apoio político de forma nenhuma. Foi apoio moral.
Eu acho que apoio moral você pode dar a um amigo que comete um erro. Cada macaco no seu galho. Político é político, artista é artista.
Eu acho também que eu nunca mamei nas tetas do governo. Nunca tive ajuda de governo e nunca apoiei governo nenhum. Portanto, posso dizer que sou uma pessoa apolítica. Não tenho partido. Tenho total liberdade, não tenho o rabo preso.
Sou uma pessoa íntegra. Ninguém, ninguém pode duvidar da minha integridade. Minha história está aí para provar. Senti-me maltratada e injustiçada... As pessoas esquecem uma biografia, toda uma história que é construtiva, que é importante neste país, que tem que ser valorizada.

Thomas - Por que a imprensa brasileira tem essa fome de maldade?
Gal -
A Música Popular Brasileira, a MPB, a minha geração toda e a geração anterior à minha, é muito maltratada. O Brasil não preserva e não dá valor ao que ele tem. O Brasil não, a imprensa do Brasil não dá valor ao que o Brasil tem de mais precioso, que é a sua cultura.
A imprensa é colonizada, tem tendência a querer destruir os seus artistas, os seus melhores artistas, ao contrário do que fazem os americanos. Eles botam para cima o que produzem.

Thomas - O Brasil degrada quem fica no Brasil. É por isso que todo mundo vai embora.
Gal -
Fazer sucesso, muito sucesso, o sucesso que ele [Caetano Veloso" fez fora do Brasil, o brasileiro fica insultado com isso. Não o público, as pessoas, mas a mídia. As pessoas que manipulam a mídia de maneira geral. Isso é engraçado, porque o Brasil é um país colonizado e age como tal. Valoriza muito o que vem de fora e destrói o que é dele, um produto que é do Brasil, que vai para fora e fica grande demais. Mas eu queria finalizar essa história...

Thomas - De quem, do ACM?
Gal -
Não, tem uma coisa muito engraçada. As pessoas me cobram, sobre o novo disco: "Ah, você diz que é um disco clássico, você optou pelo mais fácil, você é uma pessoa que costuma ousar". As pessoas falam assim, nunca estão satisfeitas com nada. Quando faço um disco clássico, ficam colocando que eu fiz uma coisa ousada. Quando faço uma coisa ousada, reclamam porque fiz coisa ousada, então, eu não sei. Nunca estão satisfeitas.
Este é um disco clássico. É um disco em que regravei canções que já foram gravadas por mim e canções que já foram gravadas por outros artistas e que eu tinha vontade de regravar. Ele é um disco bem diversificado.


Gerald Thomas é diretor de teatro.



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