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LITERATURA
Em "Louis Drax", que será filmado por Anthony Minghella, Liz Jensen oferece conforto e esperança num coma
Escritora defende fuga ao inconsciente
EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL
A escritora inglesa Liz Jensen
gosta de narradores improváveis.
Algo como Brás Cubas, em suas
memórias póstumas, que ela lamenta desconhecer. Ou Susie Salmon, em "Uma Vida Interrompida", de Alice Sebold, que ela cita.
Em "A Nona Vida de Louis Drax"
(Nova Fronteira), seu personagem principal retira, de seu estado
de coma, conforto e os elementos
de sua narrativa: memórias familiares, lembranças de uma vida
acidentada.
Em cada um de seus nove aniversários, Louis Drax esteve próximo da morte: aos quatro anos,
berrou tanto que ficou nove minutos e meio sem respirar. Teve
tétano, botulismo e meningite.
Está em coma desde que caiu de
um precipício, durante um piquenique com os pais. Mas, seria
mesmo acidente? Ou tentativa de
homicídio?
"A Nova Vida de Louis Drax" é
o quinto romance de Jensen, ex-jornalista e escultora, mas apenas
seu primeiro livro editado no Brasil. O mistério que envolve o destino de Louis, sua mãe e o médico
que cuida do menino, ecoa o passado da própria autora: em 1937,
numa viagem à Suíça, sua avó
materna foi encontrada morta
num precipício.
Jensen diz que o livro poderia
ser visto como uma tentativa inconsciente de dar forma a uma
história do passado de sua família, que nunca teve um começo,
meio ou fim adequados. Ou uma
oportunidade de catarse para sua
mãe. Nenhum dos dois. Seu interesse confesso, ou consciente, são
as "fronteiras indistintas", expressas no estado comatoso de
seu personagem.
"Acho que o coma é basicamente um estado de sonho. Ao menos
foi assim que tentei descrevê-lo
em meu livro", diz a autora em
entrevista à Folha, sustentando
que seu romance pode servir de
abrigo, em dias tão sombrios.
"Um refúgio em que um garoto
encontra esperança e conforto no
lugar mais desolado do mundo:
sua própria mente, presa numa
armadilha."
Afora a sutil fronteira entre
consciente e inconsciente, o romance de Jensen tem outra linha
tênue: a que separa o suspense do
humor. Uma dualidade que faz a
autora citar o poeta americano
T.S. Eliot: "O ser humano não pode suportar muita realidade".
Ela, tampouco. "Não consigo
suportar um só tipo de realidade,
sem o outro. O claro e o escuro se
complementam. As pessoas dizem piadas em funerais porque
precisam. O humor é vital à moral
humana, o triunfo do espírito humano na adversidade. Às vezes,
nossa única arma contra o desespero", diz Jensen. "Por isso quero
que meus leitores chorem mas
também riam", complementa.
Jensen conta que gosta de escrever na primeira pessoa. Antes de
começar o quinto livro, já tinha
em mente fazê-lo do ponto de vista de um garoto. Buscou, então,
inspiração na fala de seus próprios filhos, meninos de 12 e 7
anos, a um só tempo cruel e bem-humorada, para dar voz a Louis
Drax. Mas, como sugerir a narrativa de uma mente em coma?
"Não foi tão difícil. O grande barato de escrever ficção é que você
pode fazer qualquer coisa e ir a
qualquer lugar. Não me senti inibida porque não há limites quando se está escrevendo. Eu tinha a
voz deste menino na cabeça e ela
guiou a narrativa".
Do papel às telas
Com publicação prevista para
16 países, "A Nona Vida de Louis
Drax" teve seus direitos de adaptação para o cinema disputados
pela Warner e a Miramax. Venceu
a segunda, que deixou roteiro e
direção a cargo de Anthony Minghella. O diretor, que já levou às
telas adaptações como "O Paciente Inglês", de Michael Ondaatje, e
"O Talentoso Ripley", de Patrícia
Highsmith, deve filmar sua versão
do livro em 2006.
"Nunca mergulhei num mundo
que é delimitado pelos parâmetros de um crânio, como este livro, que captura a imaginação de
uma criança de nove anos em coma", disse Minghella, numa entrevista à BBC. "Adaptar para o cinema uma leitura fantástica como
esta era um desafio bom demais
para se recusar."
A Nona Vida de Louis Drax
Autora: Liz Jensen
Tradutora: Vera Ribeiro
Editora: Nova Fronteira
Quanto: R$ 29 (288 páginas)
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