São Paulo, sexta-feira, 01 de dezembro de 2000

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"ESPERANDO BECKETT"
Nova peça de Gerald Thomas traz um diretor menos hermético

FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

"Esperando Beckett", a mais recente produção de Gerald Thomas, em cartaz no Rio, é um Gerald diferente. Mais acessível (nenhuma palavra em alemão!), com uma estrutura quase linear, o espetáculo se aproxima do espectador de maneira eficaz.
Será uma influência da neo-atriz Marília Gabriela, mestre da comunicação eficaz da televisão? Possivelmente. O espetáculo, dividido em três momentos, tem início com uma representação nada realista de Marília, por ela mesma, num estúdio de televisão, à espera de Beckett para a gravação de um programa. É uma fase deliciosamente interessante.
Todos os textos são previamente gravados, e a ação dos atores da Cia. da Ópera Seca e da própria Gabi são de uma encenação caricatural, um deboche aos bastidores televisivos. É também uma forma brilhante de mostrar que teatro é representação. Futilidades que envolvem os momentos anteriores de uma gravação são desvendados de maneira hilária, realidade e ficção se misturam.
Esse primeiro momento cria também uma tensão: será que Gabi irá ficar o tempo todo dublando? É aí que os equipamentos entram em pane, os funcionários saem, e ela fica cara a cara com o público, sozinha, interpretando. E faz bem. Finalmente Beckett aparece para o diálogo, numa cena misteriosa, nebulosa, e então desaparece. Eis o gancho para os delírios da personagem de Marília.
É visível que ela segue à risca as marcações do diretor, às vezes nervosa até. Mas seus melhores momentos acontecem quando ela sai de trás da mesa (onde estava desde o início da peça). Aí a representação ganha pela ousadia.
Essa parte, a homenagem a Beckett a partir da peça "Malone Morre", tem um ótimo aproveitamento da atriz. Especialmente porque a estrutura do espetáculo é favorável a Marília. As frases desconexas, referências a uma filosofia do cotidiano, típicas do autor irlandês, soam naturais na atriz, que não precisa usar dos recursos clássicos do teatro, mas se entrega às propostas do diretor.
Gerald continua um construtor de belas imagens, só que desta vez menos hermético. Parece haver mais vontade de comunicação, busca de maior leveza, o que já vinha ocorrendo sutilmente nas últimas montagens, e agora encontrou o momento correto.


Esperando Beckett
    Concepção e direção: Gerald Thomas Com: Marília Gabriela e Cia. da Ópera Seca Quando: sex. e sáb., às 21h; dom., às 20h Onde: Sesc Copacabana (r. Domingos Ferreira, 160, tel. 0/xx/21/547-0156) Quanto: R$ 20




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