São Paulo, quarta, 2 de abril de 1997.

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PORNOGRAFIA
Um dos diretores mais conhecidos no gênero, norte-americano esteve no Brasil à procura de novas atrizes
John Stagliano quer ``cinema-verdade''

LUIZ ANTONIO DEL TEDESCO
especial para a Folha

Cinema pornô também se faz com uma câmera na mão e uma idéia na cabeça. "Uma forte idéia na cabeça", segundo o diretor americano John Stagliano, 45.
Stagliano esteve no Brasil esta semana para divulgar seu trabalho pelo interior do Estado de São Paulo e buscar possíveis novas atrizes para seus filmes.
Ex-dançarino profissional e ex-stripper, Stagliano faz filmes pornôs desde 1982. Estudou teatro em Hollywood e dança moderna na Universidade da Califórnia.
É hoje um dos mais conhecidos diretores pornôs. Nas locadoras especializadas de São Paulo, seus vídeos são os mais retirados e chegam a atingir 40% do movimento.
Em um país onde o fetiche masculino está centrado no quadrante superior-dianteiro da anatomia da mulher, o diretor inovou ao direcionar seu zoom para as nádegas. Foi, segundo ele, o primeiro a dar ênfase "não ao sexo anal, mas à bunda em si. Fiquei milionário por causa disso". Stagliano gasta entre US$ 8 mil e US$ 10 mil para realizar cada vídeo. Lucra por volta de 30 vezes o valor investido.
Ele criou o que ele mesmo denominou de "estilo cinema-verdade" no mundo do pornô. Os olhos de Stagliano são os olhos do espectador e também os olhos de seu alter-ego, Buttman (o personagem louco por nádegas). É o cinema-voyeur. Stagliano é o cameraman/personagem. Em sua passagem por São Paulo, ele falou à Folha. Leia trechos da entrevista:

Folha- Cinema pornô faz parte da sétima arte?
John Stagliano -
Filmes pornôs e filmes tradicionais são a mesma coisa. São entretenimento. Pegue "Máquina Mortífera 3", por exemplo. No início há cenas de ação, depois alguns diálogos, depois mais ação, depois mais diálogos. No cinema pornô também é assim. Você tem diálogos e depois sexo, diálogos e sexo...
Folha - O sr. assistiu a "O Povo contra Larry Flynt"?
Stagliano -
Ainda não. Eu não gosto de Larry Flynt e odeio a revista "Hustler". Aquele humor é um insulto à minha inteligência. As piadas são grotescas, de baixo nível e muitas vezes preconceituosas. Eu o respeito por lutar pela liberdade de expressão, mas para mim pornografia é muito mais artístico que aquilo.
Sei que no filme Flynt é retratado como uma pessoa que não é legal. Se em um filme as pessoas não são agradáveis de se ver e se não me importo com elas, não há motivação para vê-lo.
Folha - O sr. já sofreu algum tipo de preconceito?
Stagliano -
Às vezes, sinto que as pessoas têm certa dificuldade em aceitar o que faço. Há algum tempo reencontrei uma professora com quem tinha aulas de dança e contei-lhe o que fazia. Ela se assustou e me pareceu desapontada.
Aqui vejo que há maior aceitação do pornô. O Brasil é um país único. Vocês têm um forte valor religioso, mas também apelo sensual.
Folha - É fácil dirigir um filme pornô?
Stagliano -
Filmes pornôs são muito difíceis de se dirigir. Além de o relacionamento ser muito pessoal, você precisa aliar uma boa performance do ator com uma certa dose de naturalidade.
Um dos grandes problemas é que os atores são escolhidos pelos seus atributos físicos.
Folha - Nos anos 60, Glauber Rocha, um dos maiores cineastas brasileiros, disse que cinema é "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". O seu cinema é assim?
Stagliano -
Concordo totalmente. Meu cinema, em parte, é assim. É preciso ter uma idéia muito forte na cabeça, saber como olhar através da câmera e entender isso tudo.

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