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Lyra e Rodrigues discutem bossa
DA REPORTAGEM LOCAL
A bossa nova, 46, está comprimida entre duas visões distintas
de mundo, por dois dos atores
originais da época em que o movimento musical era criancinha.
De um lado, volta às gravações o
carioca Carlos Lyra, 64, um de
seus principais formuladores.
"Sambalanço" despreza o rótulo
"bossa nova", preferindo a designação "sambalanço", que ele próprio utilizou no início dos anos 60
como numa dissidência mais gingada e politizada das linhas musicais de "amor, sorriso e flor".
De outro lado, rende-se ao termo "bossa nova" o sambista paulista Jair Rodrigues, 65, que nos 60
praticava sambalanço ao lado de
Elis Regina, ignorando como a
parceira os ingredientes de maciez de voz e violão inventados
por João Gilberto.
Seu CD se chama "A Bossa Nova por Jair Rodrigues". Tenta
adaptar sua interpretação trovejante à suavidade da bossa -e vice-versa.
Lyra reexamina a história: "O
sambalanço não foi uma dissidência, não. Era apenas um acréscimo. As pessoas esquecem que
bossa nova é tudo -baião, samba, marchinha, samba-canção,
marcha-rancho".
Despista também as intenções
antigas, de artista ligado ao Centro Popular de Cultura da União
Nacional dos Estudantes (CPC-UNE). "O que eu fazia não tinha
intenção política. Isso aconteceu
mais na música "Influência do
Jazz", que era antiimperialista."
Jair relata sua distância inicial:
"Eu não era muito ligado à bossa,
via que era feita para ser uma coisa mais de exportação. Até cantava, mas ao meu modo".
"Gostava da forma de cantar de
João, mas achava que a maioria
das bossas que foram para fora foram completamente jazzificadas", completa Jair, em defesa implícita da "pureza" da "música
popular brasileira".
Embora em campos opostos,
Lyra e Jair chegam ao mesmo
ponto: a preocupação, no início
dos anos 60, com a "jazzificação"
-ou seja, a internacionalização- da música brasileira.
Cantando bossas de punho próprio (no caso de Lyra) ou dos pilares do movimento, como Tom Jobim e Vinicius de Moraes (no caso de Jair), hoje eles voltam à bossa em registros dissonantes.
Segundo Lyra: "Eu não vejo
uma cristalização da bossa, mas
uma modernização. Não penso
em me modernizar. Cheguei a
uma idade em que tenho de aceitar aquilo que parte de mim espontaneamente".
Para Jair: "Usei teclado, baixo,
bateria, violão e acordeom. Queria cavaco, mas os arranjadores
não deixaram. A idéia era infringir todas as regras da bossa nova,
fazer mais ao meu estilo".
Se os embates ideológicos em
torno da bossa hoje são ociosos, é
Lyra quem toma a palavra para
falar de presente e futuro:
"De uma maneira geral, hoje me
sinto à margem. Sou marginal, no
bom e no mau sentido. Mas hoje
não sou eu que estou com problemas, é a indústria fonográfica".
"Tenho impressão que meu CD
é um dos últimos que vão existir.
O modo de fazer vai mudar muito. É o final dos tempos, né?"
Soluções ele diz não vislumbrar.
"O CD vai acabar, sei lá o que vai
acontecer depois. Meu problema
é fazer música, não quero saber se
ouvida por satélite ou internet."
Por enquanto, aproveita o "fim
dos tempos" veiculando seu
"Sambalanço" independente pela
distribuidora da Trama -a gravadora de Jair Rodrigues.
(PAS)
SAMBALANÇO - Disco de Carlos Lyra.
Lançamento: MCK/Distribuidora
Independente. Quanto: R$ 30, em média.
A BOSSA NOVA POR JAIR RODRIGUES
- Disco de Jair Rodrigues. Lançamento:
Trama. Quanto: R$ 30, em média.
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