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Schwob, o escritor dos escritores
CASSIANO ELEK MACHADO
da Redação
Alfred Jarry lhe dedicou ``Ubu Rei''. Oscar Wilde escreveu ``Salomé'' para ele.
Seu nome também preencheu a dedicatória da primeira edição da célebre ``Introdução ao Método de Leonardo Da Vinci'',
de Paul Valéry.
Nos seus apertados 37 anos de vida,
Marcel Schwob construiu contos, poemas
em prosa, ensaios, vigorosas traduções e
renovou a narrativa com seus cruzamentos de ficção com realidade.
Apesar disso, Schwob nunca conseguiu
se livrar do estigma de ``escritor dos escritores''. Desde o começo dos ano 90, os livros mais importantes do autor francês
(1867-1905) têm sido reeditados em seu
país natal. Por trás da ressurreição do escritor está um grande cavalheiro das letras.
Schwob, pseudônimo de André Mayer,
foi assunto constante do argentino Jorge
Luis Borges, que se declarava influenciado
por duas obras centrais do autor: ``A Cruzada das Crianças'' e ``Vidas Imaginárias''.
Depois de cem anos, as ``biografias imaginárias'' de Schwob chegam ao português
conduzidas por outro escritor.
Foi Borges quem ``apresentou'' Marcel
Schwob ao poeta e tradutor Duda Machado, responsável pelo lançamento de ``Vidas Imaginárias'' no Brasil ainda neste
mês pela editora 34.
O livro inaugura a coleção ``Ilha'', que
de acordo com Machado, seu coordenador, foi criada a partir da brincadeira de
perguntar que livros você levaria para
uma ilha deserta.
Machado observa que, ao mesmo tempo
que Borges se declara influenciado por
Schwob -e, de acordo com o poeta, a influência ultrapassaria a ``História Universal Infâmia'' e chegaria até o conto ``O
Aleph''-, o escritor francês é descrito na
``Pequena Larousse dos Escritores'' como
autor borgiano ``avant la lettre''.
O que mais fascinou Borges em Schwob
foi o ``vaivém'' entre protagonistas reais e
feitos fabulosos e não poucas vezes fantásticos.
Schwob entrelaçou história e ficção com
a integração do aprendizado erudito ao
exercício criador. O escritor, que aprendeu sânscrito com Ferdinand de Saussure
na Sorbonne antes de esse ser conhecido
como o fundador da linguística moderna,
já traduzia Luciano de Samosata aos 16
anos.
O professor de literatura da Universidade Federal de Santa Catarina Walter Carlos Costa, que assina o prefácio de edição
artesanal bilíngue da obra ``A Cruzada
das Crianças'', lançada em março passado
pela editora catarinense Paraula, observa
em Schwob o ``trânsito entre fato e artefato.''
De acordo com Costa, na invenção ficcional que se inscreve dentro de situações
estritamente documentadas, Schwob
``traça a síntese da escrita impassível e do
conteúdo trágico''.
De acordo com Duda Machado, a fórmula de ``Vidas Imaginárias'' está na inserção de uma história rica em detalhes
sobre dados gerais documentais. ``Ele cria
hipóteses que são ficções a partir de dados
reais''.
Segundo o poeta, a obra tem fontes muito claras. Entre elas, ele destaca uma série
de biografias de pintores, escritas pelo artista italiano Giorgio Vasari (1511-1574).
Para Machado, a ``biografia imaginária'' do pintor florentino Paolo Uccello
(1397-1475), por exemplo, é baseada no
texto de Vasari.
Além dessa influência, para traçar a vida
de Uccello, Schwob também teria se inspirado no livro ``A Obra-Prima Desconhecida'', de Balzac, em que é contada a história de ``um pintor que está chegando por
meio da hiperconcentração em um problema da pintura à uma espécie de visão
abstrata''.
Outra fonte na qual Schwob se debruçou
para costurar as ``Vidas Imaginárias'' é
um livro da Antiguidade, publicado pelo
filósofo Diógenes Laércio: ``Vida e Doutrina de Filósofos Célebres''. As ``biografias'' dos filósofos Empédocles e Crates em
``Vidas Imaginárias'' usam como esqueleto os textos de Diógenes.
A fronteira entre ficção e realidade é tênue. No capítulo em que conta a vida de
Capitão Kid (ver página anterior), por
exemplo, Schwob insere o ``personagem
do balde'', que teria atormentado o pirata,
em uma base estritamente documental.
No prefácio do livro, Schwob comenta a
incerteza que a ciência histórica deixa sobre os indivíduos. De acordo com o escritor, se fossemos seguir o fio da história só
encontraríamos os pontos pelos quais os
indivíduos se ligaram às ações gerais.
Como Schwob passou mais tempo no
território da arte que no da ciência, buscava intensamente o oposto das idéias gerais. ``A arte só descreve o individual, só
deseja o único.''
A Obra
Vidas Imaginárias - de Marcel Schwob. Lançamento: editora 34 (r. Hungria, 592, CEP 01455-000). 190 págs. Preço: não definido
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