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CRÍTICA
Mostra é referência obrigatória
AGNALDO FARIAS
ESPECIAL PARA A FOLHA
São apenas seis esculturas.
Duas de bronze e as outras, vidro, madeira, resina termoplástica e carbono sobre polietireno.
Cinco técnicas inteiramente diversas entre si e que resultam em
seis trabalhos de grande impacto.
Mais do que suficientes para que
o público tome conhecimento de
algumas das possibilidades do
pensamento escultórico contemporâneo. E compreenda por que
dentro dele a obra de Tony Cragg
é referência obrigatória.
Situada à direita de quem entra
na galeria, uma pilha densa e monumental de vidro desfaz-se em
surpresa pela familiaridade e prosaísmo. Separadas por prateleiras
de vidro temperado, garrafas e
mais garrafas vão se empilhando
num jogo formal que alude diretamente à nossa memória dos porões e garagens das casas paternas. Armazém de detritos que
gostávamos de fuçar.
A envergadura monolítica da
peça, obtida pelo empilhamento,
provavelmente o mais remoto
dos impulsos construtivos, estilhaça-se na sucessão das paredes
das garrafas e vasos. Colados uns
aos outros, o vidro, ar estancado,
vai se revelando sutilmente esverdeado. Pele e vazio, pele e oco, a
escultura é tanto ar quanto epiderme transparente.
A preocupação com a pele das
coisas é a tônica da preocupação
desse escultor, como também o é
a demonstração que o seu trabalho consiste em infundir vida e inteligência à matéria de que elas
são feitas. "Ser Racional" e "Cristal de Madeira", aquela de carbono e esta da madeira laminada,
derivam do mesmo gesto trivial
com que nós desenhamos obsessivos desenhos circulares quando
em longas conversas telefônicas.
Para Cragg, o devaneio dos dedos é o ponto de partida para a
elevação da matéria no espaço. A
circularidade excêntrica do gesto
é o responsável para que a matéria
vá se erguendo oscilante e assimétrica. A geometria contagia-se de
vigor vital, e a peça resolve-se em
massa transbordante e dinâmica.
Em Cragg, invariavelmente os
procedimentos construtivos descambam em resultados orgânicos. Os totens, como "Cristal de
Madeira", são explicitamente eróticos. Já "Secreções", com sua
combinação de formas côncavas e
convexas, sugere o movimento de
um organismo, e sua superfície
porosa à distância atrai e agarra
nosso olhar. De perto, outra surpresa. A pele da peça é constituída
por uma infinidade de pequenos
dados. Paralisados, agora são os
olhos que rolam sobre eles, reconhecendo o um, o dois, o três...
Agnaldo Farias é professor do curso de
arquitetura e urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos, da USP
Tony Cragg
Onde: galeria Thomas Cohn (av. Europa,
641, São Paulo, tel. 0/xx/11/3083-3355)
Quando: de seg. a sex., das 11h às 19h;
aos sáb., das 11h às 14h. Até 9/6
Quanto: entrada franca, obras de US$ 80
mil a US$ 125 mil
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