São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTES PLÁSTICAS

Instalação de Pinky Wainer no Pátio do Colégio tem texto de Ferréz e números da violência contra jovem

Painel leva drama juvenil ao centro de SP

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Nas últimas semanas a periferia de São Paulo inteira foi invadida por dois jovens, cada um com uma tarja cobrindo seus olhos.
Os nomes da dupla eram Damião e Cosme, ou Cosme e Damião, como são mais conhecidos por aí. Sob suas cabeças, estavam duas auréolas e os dizeres: "Estão matando os jovens pobres".
Foi com esses cartazes, espalhados por postes de Jardins Ângelas, Cidades Tiradentes e Capões Redondos, que anunciaram sua maior aparição, marcada para hoje. Nesta tarde os dois santos ressurgem, desta vez no umbigo da cidade. Aparecem reproduzidos no painel "Licença, Senhor, Sociedade Anônima", criado, elaborado e bancado pela artista Pinky Wainer, que terá inauguração às 13h30, no Pátio do Colégio.
Os santos protetores das crianças, que por "toda a proteção que os jovens não têm" incentivou Wainer a criar essa intervenção, não estão sós no generoso painel em formato de "esse", com 2 metros de altura e 12 de largura.
"Licença, Senhor...", título que a artista plástica pinçou da obrigação que os internos da Febem têm de começar suas frases sempre dessa forma, tem desenho de crianças encolhidas em um pátio, pinturas de vermelho sangüíneo, feitas com as mãos, frases sobre indiferença, violência, desamor.
De cada lado do "esse", Wainer plotou textos feitos para o projeto pelo escritor Ferréz, que contribuiu com "Baseado em Fatos Reais", diálogos trágicos inspirados no cotidiano periférico.
"É muito bom o fato de as pessoas verem a literatura onde ela tem que estar, na rua", diz Ferréz sobre o projeto. "A idéia é essa, a coisa da contestação, de influenciar as pessoas para melhorar o cotidiano. Se elas passarem pelo texto depressa e só uma frase pegarem já está valendo."
Foram pensamentos assim que levaram Wainer a cutucar essas feridas. "O projeto tem o objetivo do impacto mesmo, de provocar reflexão, de mexer com sentimentos de pessoas que estão na rua", afirma a artista.
Ela não usou só traços e letras ("coloquei desde fragmentos de Racionais MC's até da filósofa Hannah Arendt"). Números do tamanho da desgraça do jovem pobre brasileiro também estão presos no painel. "A taxa de assassinatos no Brasil cresceu 130% entre 1980 e 2000. A maioria das mortes é de jovens favelados do sexo masculino, negros e pardos, entre 15 e 24 anos", diz um texto.
São garotos assim, que vivem nas ruas, que a artista diz que vai chamar para vigiarem o painel durante a noite, "cosmes e damiãos" de Cosme e Damião.


LICENÇA, SENHOR, SOCIEDADE ANÔNIMA. Intervenção de Pinky Wainer. Quando: hoje, às 13h30; até 30 de agosto. Onde: Pátio do Colégio (lgo. Pátio do Colégio, 2, região central, São Paulo, tel. 0/xx/11/3106-4303)


Texto Anterior: Cinema: Guédiguian encara a militância no cinema
Próximo Texto: Nelson Ascher: A autobiografia da vida
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.