São Paulo, sexta-feira, 02 de setembro de 2005

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CDS

SAMBA/CRÍTICA


Sete meses após a morte do autor de "Malandragem Dá um Tempo", gravadora reúne suas músicas em quatro discos

Caixa de Bezerra é trilha do Brasil que não muda

DA SUCURSAL DO RIO

Talvez seja por oportunismo que a Sony BMG esteja lançando "O Samba Malandro de Bezerra da Silva" sete meses depois da morte do cantor. Até porque, em vez de respeitar discos originais, a caixa os embaralha em quatro CDs de compilação. Mas a verdade é que o lançamento vem em ótima hora.
Vários dos sambas que Bezerra gravou entre 1980 e 1993 (o período da caixa, com algumas exceções) são bem maiores do que a gaveta folclorizante em que muita gente tentou e tenta trancá-los. A ojeriza aos políticos, ainda que simplista, espelha o desencanto dos tempos de "mensalão". A denúncia da hipocrisia de policiais, juízes e abastados fala da desigualdade social sem os eufemismos da mídia e do senso comum.
"Se vocês estão a fim de prender o ladrão/ Podem voltar pelo mesmo caminho/ O ladrão está escondido lá embaixo/ Atrás da gravata e do colarinho", diz ele em "Vítimas da Sociedade", um dos melhores momentos do melhor CD da caixa, o 1.
Batizado de "Eu Sou Favela" por causa do grande samba de Noca da Portela e Sérgio Mosca -que Bezerra canta com uma contundência que Seu Jorge nem tangencia em sua recente versão-, o CD reúne outras ótimas músicas de fundo social, como "Produto do Morro", "Candidato Caô Caô", "Quando o Morcego Doar Sangue" e "Pena de Morte".
Os policiais, vistos como um "outro lado" ameaçador, os "malandros" do morro e os "otários" e "cagüetes" fazem parte da fauna de "Malandro É Malandro, Mané É Mané", o segundo CD.
"Malandro Rife", "Defunto Cagüete", "Bicho Feroz" e "Defunto Grampeado" são alguns dos destaques, além de "Meu Bom Juiz", um samba dos craques Beto Sem Braço e Serginho Meriti em homenagem velada ao traficante Escadinha.
"Cocada Preta e Branca no Terreiro", o terceiro CD, é uma extensão do segundo, mas se concentra nas drogas, a "erva" e o "pó". O disco abre logo com o maior sucesso de Bezerra, "Malandragem Dá um Tempo" ("É por isso que eu vou apertar/ Mas não vou acender agora"), e conta com crônicas hilárias como "A Semente", "Garrafada do Norte" e "Se Leonardo Dá Vinte".
A caixa fecha com outros espécimes: "Cornos, Piranhas, Sogras, Pastores e Outros Manés". O sarcasmo dá o tom em "Seqüestraram Minha Sogra", em que o seqüestrador paga ao genro para devolver a "megera", e continua em "Viúva de Seis", "Pastor Trambiqueiro" e outros sambas.
O pesquisador Rodrigo Faour fez um trabalho cuidadoso de compilação, usando a peneira para, tanto quanto possível, não deixar passar coisa ruim. Bezerra foi grande mas também repetitivo. Embora menos fiel ao cantor, é mais honesto com o consumidor lançar uma caixa como essa do que todos os discos originais. (LUIZ FERNANDO VIANNA)


O Samba Malandro de Bezerra da Silva
    
Gravadora: Sony BMG

Quanto: R$ 40 (4 CDs)


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