DO CRÍTICO DA FOLHA

A morte, com o apagamento definitivo que ela traz, é a sombra que persegue cada imagem de "Esquecido Papai". Só que as emoções que o filme evoca lidam com uma perda mais simbólica que de fato -o que, talvez por isso, torna-a mais inquietante.
Concebido e codirigido por Rick Minnich, "Esquecido Papai" retraça a história de Richard Minnich, pai do diretor, que, após sofrer um acidente de carro, passa por um processo de amnésia radical que culmina com seu abandono da família.
O trabalho de Minnich filho, em parceria com Matt Sweetwood, consistirá em alinhavar os fiapos e reconstituir uma ferida, um trauma, por meio de entrevistas com familiares, imagens de filmes domésticos e, sobretudo, de testemunhos pessoais emocionados.
Na tentativa de responder à pergunta "o que terá acontecido?", "Esquecido Papai" traz à tona todo um processo mental e coletivo de construção da memória. No caso retratado aqui, vê-se que a ruptura provocada pela amnésia tem o mesmo sentido de um tecido que se esgarça. E reflete uma experiência comum aos familiares de vítimas do mal de Alzheimer, que veem seus próximos apagarem os traços de sua existência.
Ao inquirir seus próximos e indagar a si mesmo, Minnich expõe uma rede, uma trama de fios na qual percebemos que a memória aparece acima de tudo como um efeito. Isso se torna ainda mais evidente na medida em que o pai continua vivo, mas não reconhece nada mais de seu passado.
Sua memória, portanto, reside na dos outros, naqueles que sentem sua falta, que guardam os rastros de outra existência. Trata-se de uma experiência ainda mais estranha que lidar com a morte de nossos próximos. (CÁSSIO STARLING CARLOS)