São Paulo, Terça-feira, 03 de Agosto de 1999
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"1" alisa o "cabelo duro" de Wilsom Sideral

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Em 98, circulava um CD demo (que artistas fazem para seduzir gravadoras) de Wilsom Sideral. Ele parecia então -desde o nome provocativo, decalcado do de Simonal, e da figura de hippie-chique- um sujeito dos bem legais. Fazia um som encorpado, dosado entre soul, funk e blues envoltos por voz macia, meio bossa nova.
Agora ele chegou ao disco, chamado "1", pela dita gravadora "nº 1", Universal, e com produtor que cobiça o título de midas pop, Dudu Marote -homem por trás de várias das minas pop das Minas Gerais, do Skank a Pato Fu e Jota Quest (banda liderada pelo irmão de Wilsom, Rogério Flausino).
E o que acontece? A Universal, que não é sideral, fica tão pé na terra quanto sempre. E o Sideral ganhou padrão Universal. Se é a gravadora, o produtor ou o artista, só eles podem dizer, mas entre a demo e o "1" aconteceram modificações desconcertantes.
Ele continua um cara legal. Mas o frescor ficou perdido num projeto mercadológico bobo: construir um clone do Jota Quest, banda da hora no circuito rádio-programa "H"-feira fajuta de CDs.
A voz "easy listening", saborosa como queijo de Minas, adquiriu a "síndrome de Ed Motta", dos garotos que pensam que ser "soul" é forçar a voz como tivessem dor de barriga. O pior momento de canto intestinal é a cover de "Bem Que Se Quis" (que deu fama a Marisa Monte, em 89) -gemer não transforma branco em negro, nunca; sabendo disso é que Erasmo Carlos foi um dos grandes nomes do soul brasileiro.
Bem, nada disso quer dizer que se esteja diante de um projeto frustrado. "1" é um disco um pouco legal de um cara bem legal.
"Wilsom" é provocadora ("sou Wilsom, o urso do Terceiro Mundo"); "Não Pode Parar" é o "Tão Fácil" (do Jota, que Sideral compôs) de seu disco, o que a torna imediatamente polêmica; "Zero a Zero" e "Xote Atômico" ("xá, xé, xi, xó, xote atômico") perderam personalidade, mas ainda são pequenos achados; "Brasileiro" é Jorge Ben 1969 -isso não a faz legal, mas ela é legal.
No todo, "1" é exemplo de como convenções industriais vêm achatando o fogo criativo brasileiro. Quem tem que cortar esse oba-oba são os artistas, e o "urso do Terceiro Mundo" tem as armas escondidas no cabelo duro.


Avaliação:   



Disco: 1
Artista: Wilsom Sideral
Lançamento: Polydor/Universal
Quanto: R$ 18, em média





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