|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Cimino vem mexer na história do Brasil
FERNANDO OLIVA
da Redação
O diretor norte-americano Michael Cimino desembarca neste
domingo em São Paulo para mexer
com a história do Brasil e com o
padrão de orçamento do cinema
nacional. "Gonçalo", seu filme sobre a saga do nosso descobrimento, está orçado em US$ 35 milhões,
a mais cara produção da história
do cinema brasileiro (como comparação, o épico "Guerra de Canudos" custou R$ 6 milhões).
Mais: o cineasta norte-americano acredita que "Gonçalo", a superprodução que reconta a saga
portuguesa sob a ótica de um marujo da frota de Cabral, pode fazer
sucesso entre o público dos EUA.
Em entrevista concedida à Folha,
por telefone de Los Angeles, o diretor de "O Franco-Atirador" e "Horas de Desespero" disse que seu oitavo longa-metragem não será um
épico histórico, mas a trajetória de
um indivíduo (o marujo Gonçalo
Fonseca) que tem como pano de
fundo um momento de grande turbulência no planeta,
a era das navegações no início do século 16.
"É óbvio que vai ser grandioso,
porque é a natureza do meu trabalho, mas eu não quero dirigir um
épico abstrato, e sim uma história
muito pessoal."
Do lado brasileiro da parceria,
está a Tatu Filmes, de Cláudio
Kans, e o empresário Fábio Fonseca. Dos EUA, os produtores Ilya
Salkind (da série "Superman") e
Jane Chaplin, a filha mais nova de
Charles, que chegam ao Brasil neste sábado.
Cimino vem ao país para se reunir com atores, produtores locais e
possíveis investidores. Depois, visita Brasília e Porto Seguro -no litoral baiano, sai em busca das melhores locações para seu filme.
As filmagens só devem ter início
no ano que vem, e o lançamento de
"Gonçalo" (título provisório) está
previsto para o final do ano, simultaneamente no Brasil e nos EUA.
Folha - O sr. acredita realmente
que um filme sobre o descobrimento do Brasil pode interessar
aos americanos?
Michael Cimino - Eu não acho
que importe o local onde o filme
foi rodado. Nós vimos a popularidade de todos os tipos
de filmes na América...
filmes da França, da
Espanha, da Argentina, Itália, China. Então por
que não poderia acontecer a mesma coisa com um filme brasileiro?
Boa parte de "Butch Cassidy", um
filme muito popular, se passava na
América do Sul.
O que tentamos fazer é muito
simples, um filme o mais próximo
possível da realidade, mas ao mesmo tempo o mais próximo possível do entretenimento. Se atingirmos nosso objetivo, acho que as
pessoas vão se interessar.
Folha - Porque um diretor com
uma carreira em Hollywood resolve fazer um filme no Brasil, co-produzido por brasileiros, sobre a história do Brasil?
Cimino - Eu não gosto de categorizar os filmes dessa maneira. O cinema, hoje, é uma indústria global.
Nos últimos dez anos vimos, por
exemplo, filmes chineses por toda
a parte. Não há mais nada de estranho em relação ao lugar onde um
filme é feito. Bernardo Bertolucci
fez "O Último Imperador" na China, Scorsese fez "Kundum" na
Ásia, e o "Sete Anos no Tibet" de
Jean-Jacques Annaud foi rodado
na América do Sul. Poucos filmes
hoje são completamente rodados
em Hollywood, talvez só os desenhos animados da Disney (risos).
Folha - Como em "O Franco-Atirador", "Gonçalo" tem como pano
de fundo a história de um país. Isso, de alguma maneira, limita o
seu trabalho?
Cimino - Num filme, você deve
transformar os fatos em entretenimento. É algo para ser visto, necessita de certa exuberância, energia,
precisa ser cheio de vigor, mas tudo isso ao mesmo tempo em que
você fala sobre coisas que realmente aconteceram.
Folha - "Gonçalo" pretende fazer
algum tipo de ligação entre o passado e o presente do Brasil?
Cimino - Não, o filme se passa inteiramente no século 16. Não há
nenhuma intenção de comentar a
situação de seu país hoje...
Folha - O sr. acha que rodar um
filme também encerra a idéia de
passagem e transformação?
Cimino - Todo filme, ou todo
bom filme, é sobre descobrir alguma coisa, descobrir algo que você
não conhecia antes. Durante a jornada do filme você faz seu próprio
descobrimento, entra em contato
com coisas que não conhecia e das
quais nunca ouvira falar.
Folha - A paisagem dos EUA é dona de um papel crucial em seus filmes. Como a sua câmera vai se
aproximar da paisagem brasileira?
Cimino - Eu espero encontrar alguns lugares que as pessoas ainda
não filmaram, alguma parte intocada do litoral. Eu não quero mostrar nada que já tenha aparecido
em qualquer outro filme, que é o
que eu tento fazer em todo filme
que realizo.
Esta é uma oportunidade única
de mostrar as coisas de maneira diferente, de uma maneira que praticamente não foi mostrada antes.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|