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Crítica/"O Dia Mastroianni"
Em obra promissora, Cuenca leva os clichês à saturação
Depois de boa estréia, escritor continua a utilizar referências pop em narrativa
ADRIANO SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
"O Dia Mastroianni",
de João Paulo
Cuenca, conta algumas horas das peripécias de
Pedro Cassavas, o narrador de
boa parte do romance, e Tomás
Anselmo entre bebidas, mulheres, conversas e encontros com
figuras como o sr. Mxyzptlk, velho escritor melancólico com
um problema bem delicado de
saúde (e a referência aqui, como em outros momentos, é a
cultura pop: Mxyzptlk é um dos
vilões mais divertidos das histórias do Super-Homem, um
duende de outra dimensão que
consegue alterar a realidade...).
À narrativa propriamente dita, alterna-se uma espécie de
entrevista/tortura com o escritor-personagem na qual uma
mistura de crítico, editor, revisor e reflexo do autor fictício
põe em questão os eventos que
vão sendo apresentados. Responsável por alguns dos momentos mais engraçados da
obra, é essa entidade, por outro
lado, que expõe, quase como
um irônico pedido antecipado
de desculpas, o que poderia ser
o principal problema do volume: "Estamos cansados de narrativas que se curvam sobre si
mesmas escritas por narradores autoconscientes em crise.
Essa interminável fuga de espelhos... Artifícios ultrapassados
de metalinguagem!".
Como diz a orelha, "O Dia..."
é um romance dos "clichês de
uma geração que, por tanto temer os lugares-comuns, acaba
confundindo-se inapelavelmente com eles". O problema é
que fazer clichê do clichê também já virou um lugar-comum
e o mero embate engraçadinho
entre o perambular da dupla de
protagonistas e o questionário
corrosivo tenderia ao vazio se o
autor não tivesse criado um outro giro no parafuso com seu último capítulo, no qual esse anulamento é redimensionado. Ali,
um narrador em terceira pessoa assume o comando e, numa
superposição de registros bastante elaborada, que leva à saturação máxima todos os personagens que encontráramos
até então, tudo implode, inclusive o clichê do clichê.
Com "O Dia Mastroianni",
Cuenca supera o desafio de escrever o sempre complicado segundo livro depois de uma estréia promissora ("Corpo Presente", ed. Planeta). É, ao que
tudo indica, um autor que vale a
pena acompanhar.
ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura
da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da
USP
O DIA MASTROIANNI
Autor: João Paulo Cuenca
Editora: Agir
Quanto: R$ 34,90 (216 págs.)
Avaliação: bom
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