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"CANTO DE PÁGINA: NOTAS DE UM BRASILEIRO ATENTO"
Obra de Sarney fica em pé na estante
RONALDO COSTA COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Junho de 1997. Lula chora em
reunião do PT. Magoado, diz
que "criaram a segunda Miriam
Cordeiro" ao comparar denúncia
de envolvimento dele em irregularidades com a atuação de ex-namorada na campanha de Collor
em 1989.
Ótimo gancho, tema forte. Sarney percebe e escreve "A Lula o
que é de Lula", crônica de 13 de junho de 1997. Defende Lula, pede
que respeitem a história de vida
dele. Trecho: "O PT foi sempre
muito duro comigo e muitas vezes teve uma leitura errada de
meu governo que, diga-se de passagem, foi o período que abriu espaços para ele crescer. O partido
disputou a Presidência, quase
chegando lá, com um candidato
ao qual, por mais que dele discordassem, ninguém podia negar a
biografia extremamente comovente de um retirante do Nordeste, [..." que, pelas suas qualidades
de liderança, assumiu uma posição de comando do movimento
trabalhista: Luiz Inácio Lula da
Silva".
"Canto de Página: Notas de um
Brasileiro Atento" reúne 107 textos de José Sarney publicados de
1996 a 1998, às sextas-feiras, na
Folha. Visão e pensamento dele
sobre política, jornalismo, literatura. Do trivial variado às virtudes, perigos e males da globalização. Neoliberalismo, Lula, papa,
ovelha Dolly e vasto etc.
Linguagem leve, concisa, clara.
O autor vive dizendo que um texto nunca fica pronto. Redige, corta, desbasta, reescreve, mede, lixa,
lustra, enfeita. Entrega no limite
do prazo e fica para sempre com a
sensação de que não acabou de
acabar. Um perfeccionista.
Olhar jornalístico, voltado para
o presente. Mais para a árvore do
que para a floresta. Visão brasileiríssima, mas não xenófoba. Obra
de escritor-jornalista que atenta
aos Brasis e ao mundo e tem quase 50 anos de janela e de palco do
poder. Inclusive no principal, como protagonista e como coadjuvante. Deputado estadual e federal, governador, senador, chefe de
estado e de governo, presidente
do Congresso, leitor ladino de almas e de interesses.
Literatura no jornalismo? Ele
garante que dá e aponta provas.
Como a "Coluna do Castello", do
prodígio Carlos Castello Branco,
o Castellinho (1920-93). "O Castello fazia textos literários sobre política todos os dias."
Sarney sabe espremer idéias e
fatos relevantes nas linhas do seu
canto. Dom para criar e escrever
que deu "Saraminda" (2000),
considerado pelo mestre Carlos
Heitor Cony "um dos romances
mais bem estruturados e narrados da ficção contemporânea".
Por que o livro? Sarney: "Machado de Assis dizia que os artigos
que a gente não reúne em livro somem. Conforme o Josué Montello, tem de ser livro que fique em
pé na estante".
Pena que "Canto de Página"
não chegue a 2002. Destaque no
gênero, tem dois irmãos do mesmo autor: "Sexta-feira, Folha", de
1994, e "A Onda Liberal na Hora
da Verdade", de 1999. Os três param em pé.
Ronaldo Costa Couto é escritor e doutor em história pela Sorbonne (França)
Canto de Página: Notas de um
Brasileiro Atento
Autor: José Sarney
Editora: Arx
Quanto: R$ 29 (240 págs.)
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