São Paulo, domingo, 04 de janeiro de 2004

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MÚSICA

"THE DIARY OF ALICIA KEYS"

Após se firmar como diva do soul, cantora abraça a "vibração do funk" no segundo disco

Alicia Keys descobre o balanço dos 70

Andrew Medichini/AP
A cantora e compositora Alicia Keys, cujo primeiro disco vendeu dez milhões de cópias nos EUA


ALEXANDRE MATIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A entrevista começa com uma gargalhada que destoa do tom sussurrado que se segue por todo o resto da conversa.
Alicia Keys ri da repetida preocupação sobre as pressões que teria sofrido durante a realização de seu segundo álbum, "The Diary of Alicia Keys". "As pessoas querem que eu diga que sofri, que passei maus bocados, que o disco foi difícil de ser feito!"
A preocupação não é infundada, uma vez que poucos artistas que estrearam no século 21 tiveram um desempenho tão eficaz em sua estréia quanto Keys em seu "Songs in A Minor", lançado em 2001. Com apenas 22 anos, ela começou como profissional de música aos 14. Pianista de formação erudita, logo abraçou a soul music e caiu nas graças do produtor Clive Davis, que viu uma mina de ouro em Keys.
Aposta certa, seu primeiro disco vendeu dez milhões de cópias só nos Estados Unidos e faturou cinco prêmios Grammy -sucesso puxado pelo hit "Falling". Com apenas um disco, se alinhava a divas do soul moderno que levaram tempo para conquistar seu espaço no panteão, como Mary J. Blidge, Erykah Badu, Jill Scott e Lauryn Hill.
No novo disco, ela se mantém fiel à matriz sonora de soul erudito que lhe caracteriza, citando Motown ("If I Ain't Got You" e "You Don't Know My Name", com direito a interlúdio falado de mais de um minuto -e sem deixar a bola cair), Dionne Warwick ("If I Was Your Woman" e "Harlem Nocturne"), Whitney Houston ("Wake Up") e Nina Simone, morta em 2003 e presente em quase toda a atmosfera de quase todo o disco.
Mas o ambiente de "Diary" também sente o peso do calor funk setentista, seja com o produtor Timbaland emulando Isaac Hayes ("Heartburn"), seja em faixas de puro apelo groovy ("Karma" e "Dragon Days"). Na entrevista a seguir, ela fala mais sobre esses assuntos.

Folha - O fato de você chamar o disco de "diário" diz respeito ao período entre o primeiro e o segundo disco ou é uma espécie de diário de toda a sua vida?
Alicia Keys -
Eu acho que é uma mistura de ambas as coisas. Creio que, quando comecei a pensar nele como um diário, eu queria mesmo registrar a época posterior ao primeiro. Mas à medida que fui compondo e gravando, percebi que, mais uma vez, estava falando de toda a minha vida. Então acho que não tem como fugir disso.
Eu não tenho uma forma particular de compor, as coisas vêm à minha cabeça e eu componho. Por isso chamei o disco de diário. Minhas canções são, definitivamente, anotações que faço sobre a minha vida. É ela que me inspira. E é por isso que faço música. Não é por fama, por dinheiro ou qualquer outra coisa do tipo. Acredito na minha música.

Folha - O disco tem uma pegada mais funky.
Keys -
É, com certeza. Apesar de, no geral, ser uma coisa de timbres e texturas, não apenas de ritmo. Apenas algumas músicas soam mais funk, no sentido original da palavra. Mas o disco tem uma vibração de funk. Tenho ouvido muitas coisas nessa linha, acho que é uma fase.

Folha - E o que você tem ouvido?
Keys -
Agora que terminei o disco é que estou voltando a ouvir música de forma mais relaxada. Tenho voltado aos discos recentes de soul, como os da Jill Scott ou da Erykah Badu. Antes disso, estava apenas junto aos clássicos, em busca de inspiração -Miles Davis, Marvin Gaye, Coltrane, Stevie Wonder, todos esses velhos (risos)!

Folha - Você não tem ouvido hip hop? O gênero atravessa uma ótima fase atualmente.
Keys -
Sim, mas ainda está preso à grana e isso é um saco. Há muitos bons discos de rap sendo lançados, mas os caras que mais fazem dinheiro e que são mais populares fazem algo que, para mim, é a morte do hip hop.
Eu cresci em Nova York, junto com o próprio hip hop, e havia uma espécie de regra tácita de que nenhum artista poderia copiar o que outro fazia. Quem fazia isso era malvisto. Hoje, os artistas de hip hop mais conhecidos são justamente os que mais copiam coisas que já foram feitas.


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