São Paulo, terça-feira, 04 de março de 2003 |
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Trasmissão de sentimentos
KATIA CALSAVARA FREE-LANCE PARA A FOLHA Um eco: "João Amava Teresaaa". Uns estampidos soam como tiros. Surgem corpos que se arrastam pelo chão, quase animais. Uma mulher descasca e chupa laranja no palco. Homens lembram chafarizes. Sem falar no modo como transportam seus pares, em cima do abdômen. Tais barulhos e cenas, desconexos, são parte da nova coreografia de Jorge Garcia, 31, autor de "Divinéia", sucesso do Balé da Cidade de São Paulo no ano passado. A trilha da coreografia é inusitada, assim como toda a fase de concepção da obra. "Durante o processo de criação é que as coisas foram amadurecendo. Não tinha nada pronto na cabeça. Só sabia que queria fazer algo sobre relacionamentos. Chamei o DJ Dolores para compor a trilha, e artistas da Bijari [grupo de vídeo-artistas" para as projeções", diz Garcia. O bailarino enviou fitas em VHS com cenas para Dolores. "Ele não me instruiu a fazer nada em específico. Foi diferente de tudo o que já fiz. Um processo de criação completamente anárquico", explica o DJ. A data prevista para a estréia é 3 de abril, no Teatro Municipal de São Paulo, quando Dolores levará um "miniestúdio" ao palco, assim como flautas, rabecas e cavaquinhos da Orchestra Santa Massa, que o acompanha. "A dança permite uma livre experimentação. É um conceito abstrato, sem melodia certa, ao mesmo tempo com objetivos mais bem definidos do que os da pista. Adoro esse tipo de trabalho", diz Dolores. Para Jorge, o ano passado foi repleto de conflitos amorosos- pelo menos entre os que o rodeiam-, e isso o inspirou. "Minha idéia era jogar movimentos em cima do que eu sentia e do que as pessoas me transmitiam", diz. Pernambucano, ex-asmático e ex-surfista, Jorge começou seus estudos de dança aos 19 anos. Filho de jogador de futebol, morou em Portugal durante sete anos e de lá voltou ao Brasil por causa do clima que prejudicava sua saúde. Queria ser arquiteto, fez curso técnico em edificações, prestou vestibular e não passou. Deu de ombros. Nessa época, Jorge já sabia que queria dançar. Antes de vir para São Paulo, fez parte de um grupo de danças populares e de uma companhia moderna. "Quando cheguei a São Paulo, fiz algumas aulas e logo entrei no Cisne Negro. Foi lá que descobri como era dançar profissionalmente. Poderia passar a vida inteira coreografando." Texto Anterior: Bernardo Carvalho: Entre o paternalismo e o medo Próximo Texto: Balé da Cidade faz 35 anos e "redança" trabalhos Índice |
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