São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2005

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CINEMA

"ESPANGLÊS"

Após "Melhor É Impossível", James L. Brooks investe em história sobre faxineira em casa de chef renomado

Cineasta mira no "povo invisível" latino

TETÉ RIBEIRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, NA CALIFÓRNIA

James L. Brooks tem uma boa desculpa para não trabalhar no ritmo de Hollywood, se recusando a dirigir um ou dois filmes por ano (a média ruim) ou mesmo um filme a cada dois anos (a média boa). "Fiz cinco longas até hoje. Comecei a trabalhar em 1969, o que dá uma média de um filme a cada sete anos, o que acho bastante satisfatório", disse ele, em entrevista à Folha em Los Angeles, quando do lançamento nos Estados Unidos de "Espanglês", que estréia hoje no Brasil.
É uma boa média, que melhora quando se sabe que, entre os quatro filmes que antecederam o de hoje, estão sucessos de público, crítica e Oscar como "Laços de Ternura" (83), "Nos Bastidores da Notícia" (87) e "Melhor É Impossível" (97). "Geralmente, escolho um tema depois de ler um livro a respeito. Então passo cerca de cinco anos estudando o tema desse livro", diz ele. "Daí levo uns dois anos para filmar." Simples? Foi assim com "Espanglês".
"A comunidade latino-americana, ou hispânica, chame como você quiser, está em todo lugar nos EUA", contabiliza. "O sul do país e o norte do México hoje em dia se confundem. Eles estão em todos os lugares de Los Angeles, por exemplo, que é a cidade em que vivo, mas ao mesmo tempo são um povo invisível para nós, da chamada classe alta [Brooks mora no exclusivo bairro-cidade de Bel-Air, no miolo rico de Los Angeles]. Você entra numa rua e encontra não mais um bairro de mexicanos, mas minicidades, divididas pela origem das pessoas, pela cidade de onde elas vieram."
Assim ele criou a história de Flor Moreno (a espanhola Paz Vega, em seu primeiro papel no cinema norte-americano), uma faxineira que acaba se envolvendo com a família do renomado chef de cozinha John Clasky (Adam Sandler) e sua mulher, a hiperativa Deborah (Téa Leoni). Completam o elenco as meninas Christina (Shelbie Bruce) e Bernice (Sarah Steel) e a sogra do chef, a alcoólatra Evelyn, interpretada por Cloris Leachman, mais conhecida como Phyllis, a vizinha de Mary Tyler Moore.
A série de TV homônima à atriz, aliás, é de autoria de Brooks, um nativo de Nova Jersey de 64 anos que se criou em Nova York e demorou muito a conceder que o tipo de vida que queria levar, no mundo artístico, exigia sua mudança para Los Angeles. "É uma cidade esquisita. Há duas maneiras de morrer por aqui: ser fracassado ou fazer sucesso."
Brooks também está por trás de "Os Simpsons" há 16 anos, desde a estréia da mais longeva série de animação da TV norte-americana. "Fazer essa comédia é minha válvula de escape, onde posso falar mal de quem eu quiser, até do Brasil", brinca, referindo-se ao polêmico episódio em que a família visitava o Rio.
Há duas semanas, Brooks colocou Homer Simpson como juiz de paz de casamentos gays em Springfield. Levou lambada de tudo quanto foi organização conservadora norte-americana, e elas estão em número cada vez maior desde a reeleição de George W. Bush. Aliás, o que ele acha do assunto? "Ninguém pode estar feliz com os Estados Unidos de agora. Eu também não estou. O jogo está mudando, é difícil, eu diria que estamos em uma busca pessoal como povo", teoriza.
"Nesse contexto", diz, "temos de nos concentrar no que nós concordamos, não no que discordamos". Ele se refere à profunda divisão por que o país passa desde a reeleição de Bush, em que o interior do país, chamado de "América profunda", acusa as costas e principalmente Hollywood de ter se dissociado da realidade do seu povo. "Mas o que eles querem? Dissociar-se da realidade é o que fazemos melhor. É por isso que eles vão ao cinema."


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