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"RESPIRO"
Ritmo de cotidiano dá brilho ao filme
CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Em "Respiro", a imagem inicia-se dúbia: transita, com
fluente volatilidade, entre deterioração e sintomas de vida. O esqueleto de uma piscina sem água,
austero depósito de concreto e detritos, é aproveitado como brinquedo. Lá perto, crianças alicerçam castelos de entulho. Cães,
aves e peixes constituem fauna
simbólica: vivos, enfrentam morte e perecimento, todo dia. Na
mesma cidade, o sol arde luminoso e o mar espuma em azul turístico, cotidianamente.
E é no cotidiano que está o brilho de "Respiro", ambientado em
uma vila siciliana. A primeira metade do filme é tecida ritmicamente na cadência da rotina, o
que nos faz íntimos de lugares e
de pequenos incidentes. Embarcamos no vaivém de uma família:
dias passam na repetição carinhosa de futuras nostalgias provincianas, como as simulações de faroestes repletas de sádico e alegre
contato físico entre os meninos.
Aliás, o coração do filme bombeia tensão, de todo tipo, entre
corpos. O tom de "Respiro", no
entanto, é de lírica inquietude,
sem endurecimento em observações geográficas e humanas.
Na segunda metade do filme, os
olhares são alterados. A lógica,
aqui, imerge em redomas intimistas, enlouquece em alienação. A
câmera, porém, perde a maleabilidade da cadência cotidiana e é
anestesiada por ferramentas de
impacto, sobretudo em registros
de praia. Cede-se espaço a uma letargia que, embora pareça correta
em termos conceituais, dialoga
problematicamente com o filme.
Ainda assim, "Respiro" é obra
ambígua que permite ser sentida.
Respiro
Idem
Direção: Emanuele Crialese
Produção: Itália/França, 2002
Com: Valeria Golino, Vincenzo Amato
Quando: a partir de hoje nos cines
Cineclube DirecTV, Espaço Unibanco e
Lumière
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