INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Há muito de típico em "Caçada Humana". Marlon Brando faz o herói dividido e impotente, com um pé na lei e na ordem (é um policial) e outro que olha o mundo humanamente.
Robert Redford é o rebelde da história. Um jovem preso injustamente que foge da cadeia e volta à sua pequena cidade. É recebido como um marginal. De certa forma, seu retorno não interessa a ninguém, ou quase ninguém. Existe, por fim, Jane Fonda. A ex-amante de Redford. Em sua ausência, transa com outro cara. Mas seu amor é pelo rapaz.
A estrutura de "Caçada Humana" há muito caiu em domínio público e, de certa forma, perdeu sua eficácia: qualquer telefilme pode recuperar trechos dessa proposta. Mas o filme permanece de pé. No início, nem tanto: à força de ver sua estrutura repetida, tememos reencontrá-la.
Mas é aos poucos que o filme vai mostrando seu estofo. É na medida em que a acolhedora cidade começa a mostrar uma qualidade insalubre que não está em seus personagens -por sórdidos que sejam-, mas que vem dela.
Isto é: nessa dramaturgia, o que conta não é opor mocinhos e bandidos, mas expor a ambos como produtos de uma maneira de ser da sociedade. De uma sociedade intrinsecamente violenta, diga-se.
Ora, também isso já foi mostrado centenas de vezes. Mas raramente teve a força inusitada da seqüência em que Redford é perseguido no ferro-velho, enquanto a população faz uma espécie de convescote em que cada um parece celebrar a própria inocência formal e, com base nela, se entregar à perversidade. É também um velho oxímoro: as cidadezinhas paradisíacas com seus habitantes ao mesmo tempo infernais e inocentes. Mas Arthur Penn o conduz com tanto rigor que parece renascer diante de nossos olhos.
O DVD, porém, vem praticamente a seco, o que é uma pena.

Caçada Humana
The Chase
   
Direção: Arthur Penn
Produção: EUA, 1966
Distribuidora: Columbia