São Paulo, sábado, 4 de julho de 1998

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LIVRO
Big Richard agora escreve histórias para crianças, visando um público que não se identifica com as importadas
Rapper quer criar literatura infantil negra

CYNARA MENEZES
da Reportagem Local

O cantor Hamilton Richard Ferreira, 24, o Big Richard, quer fugir do estigma de "marginal" que ronda os rappers: com fama de bom moço, contrário ao uso de drogas e defensor da religião, Big Richard agora escreve histórias para crianças.
"Sou tido como careta", assume o rapper, carioca radicado em São Paulo desde 94, ano em que foi preso em um show no Anhangabaú por, segundo os policiais militares que invadiram o palco, "incitação à violência e desacato à autoridade".
O motivo era a letra de "Homens da Lei", violenta crítica à polícia que volta em um medley com "Polícia", dos Titãs, no disco que Big Richard lança até o final do mês (leia texto abaixo). O processo continua em andamento.
Nos livros, o neo-escritor quer atingir a criançada negra. "Não existe literatura infantil para o público negro", diz. "Só falando sobre a Inglaterra, com crianças loirinhas."
Como em muitas obras para pequenos, o primeiro livro de Big Richard tem como personagem central um herói, mas de carne e osso e pele negra: Zumbi, o líder do Quilombo dos Palmares.
"O negro só recebe informação sobre Zumbi quando já está na universidade", diz Richard, que pesquisou, escreveu o livro e pediu a um amigo, também negro, que fizesse as ilustrações. Conseguiu publicar pela Planetinha Paz.
"O Rei Zumbi" é apresentado como um herói da liberdade, que defendia negros, brancos e índios que não estavam satisfeitos com o governo do Brasil Imperial.
É um livro simples, escrito em linguagem popular, como outras histórias do rapper também publicadas pela editora Planetinha Paz na coletânea "Zeca e Juninho no Mundo dos Homens". São três contos a favor da igualdade interracial e entre os sexos, influenciados pela fé Baha'i- religião fundada no século 19 na Palestina.
"Acho que as pessoas têm que ter uma religião, um ponto de apoio. Gosto da idéia Baha'i de igualdade na diversidade", diz.
Sobre as drogas, é duro, mas não radical: não usa, mas respeita quem fuma maconha.
Big Richard defende, porém, outros caminhos. "Acho que para o pobre só há dois: ou vira "avião' (quem faz a ligação do traficante com o comprador) ou trabalha muito e mostra do que é capaz. Eu fui pelo segundo."
Para o rapper, uma pessoa pobre envolvida com droga vive uma situação de perigo de vida. "Se ele deve R$ 5 na "boca', morre fuzilado. Essa é a recuperação do pobre. Pobre não tem clínica de desintoxicação", diz.
Para provar que não é conversa fiada, ele será a estrela do novo anúncio institucional da campanha contra as drogas, um videoclipe com um rap de sua autoria.
E já tem outros projetos. Prepara um novo livro infantil, contando a história de um menino que vende balas no semáforo e é procurado por traficantes de drogas, e escreve um roteiro para um curta à Spike Lee. "Quero fazer cinema negro brasileiro", promete.



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