São Paulo, sábado, 04 de agosto de 2001

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"RKO 281"

Telefilme "RKO 281" desvenda bastidores de "Cidadão Kane"

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

"Cidadão Kane" é um marco incontornável da história do cinema não apenas por ter virado do avesso a narrativa cinematográfica clássica, mas pelo impacto que causou no sistema dos estúdios e nas relações destes com a chamada opinião pública.
O telefilme "RKO 281", que o canal por assinatura HBO exibe amanhã, às 22h, centra seu foco justamente nessa espécie de crise institucional que o filme provocou e que tornou seu realizador, Orson Welles, uma "persona non grata" em Hollywood.
Como se sabe, Welles escolheu como tema, para seu filme de estréia, o retrato labiríntico de um grande magnata da imprensa. Inspirou-se em William Randolph Hearst, dono da maior rede de jornais e emissoras de rádio dos EUA. Embora as filmagens tenham sido cercadas de sigilo pela RKO -que tocava o projeto sob o título de trabalho "RKO 281"-, Hearst acabou sabendo da história toda e tentou impedir "Cidadão Kane" de vir à luz.
Chantageados por Hearst, que ameaçava denunciar os escândalos mais escabrosos de Hollywood em seus jornais, os chefões dos estúdios pressionaram a RKO para queimar o negativo e as cópias do filme. Dirigido por Benjamin Ross ("O Livro Secreto do Jovem Envenenador") "RKO 281" reconstitui ficcionalmente essa rede de intrigas. Além disso, procura traçar a gênese do filme, desde o amadurecimento da idéia até os percalços das filmagens.
Embora o destaque seja para as relações conflituosas entre Welles (Liev Schreiber) e o roteirista Herman Mankiewicz (John Malkovich), há espaço para as discussões entre o cineasta e o diretor de fotografia Greg Toland (Liam Cunningham).
O que há de mais discutível em "RKO 281" é o fato de assumir "Cidadão Kane" como um "roman à clé" em sentido estrito, com seus personagens correspondendo a figuras reais. Por exemplo, a amante de Hearst, a atriz Marion Davies (Melanie Griffith), é apresentada como modelo único da estúpida e sem talento Susan Alexander, a última mulher de Kane.
Ao fazer isso, o telefilme indiretamente dá razão aos argumentos censórios de Hearst e diminui a importância da imaginação de Mankiewicz e Welles na construção da história e dos personagens.
Seja como for, "RKO 281" é um eficiente melodrama televisivo que envolve o espectador ao mesmo tempo que o introduz nos bastidores nada edificantes da cultura de massa americana.
Ganhou o Globo de Ouro de melhor filme para a TV.

RKO 281    
Produção: EUA, 1999
Direção: Benjamin Ross
Com: Liev Schreiber, John Malkovich, James Cromwell, Melanie Griffith
Quando: amanhã, às 22h, na HBO



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