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"DEZ MULHERES"
Reale Jr. estréia em contos com detalhes delicados do cotidiano
ADA PELLEGRINI GRINOVER
ESPECIAL PARA A FOLHA
O primeiro livro de contos
de Miguel Reale Jr. é encantador: a descrição de pequenos
detalhes do cotidiano, na realidade vivida por dez mulheres muito
diferentes, que têm como traço
comum se encontrarem frente a
um impasse, resolvido cada qual a
seu modo.
E a decisão tomada é sempre
surpreendente, como convém ao
conto, pois, a meu ver, a tônica da
literatura curta há de ser a surpresa.
Assim, o leitor percorre com interesse sempre vivo tantas histórias: a da gravidez da sobrinha de
uma mulher sem filhos, marcando a desgraça de uma e a euforia
de outra, e a da presidiária que havia vivido em cárcere privado e
que conheceu na cadeia a liberdade de ser uma pessoa.
A da moça certinha que vive a
vida conforme o planejado e desiste do amor para que as coisas
não fiquem fora de controle, e a
da doente terminal de mãos macias, apaixonada pelo amor, que
consegue dar prazer a um jovem
médico e já tem 80 anos.
A da traição do marido e da reação da mulher, que se despede para sempre com um simples recado: fui velejar com meu pai, e a da
mulher que se identifica com uma
princesa francesa do tempo das
cruzadas, mas que muda o destino solitário da filha do rei, cedendo ao amor do trovador
A da faroleira que inventa histórias por puro deleite, emocionando-se com a vida fictícia, mas que
só encontra o amor pela via da
verdade, e a da injustiçada que se
sublima tornando-se vingativa, a
pretexto de fazer justiça, até descobrir a existência de Xangô.
A da intelectual famosa e badalada, incomodada pelo sucesso da
filha, mas que, de professora emérita, consegue tranformar-se em
mãe.
E o último conto, o que mais me
agradou, sobre a moça casada
com um homem detestável e que
encontra o amor numa relação
homossexual, conseguindo livrar-se do marido com um expediente engenhoso.
São delicadas histórias de amor,
apresentadas nas mais diversas
facetas e vividas de acordo com a
realidade de cada mulher.
E tudo é escrito num estilo sóbrio, despojado, que às vezes mistura sabiamente os tempos passado e presente, em que se destacam
frases lapidares como "amou e
gritou de gozo até a manhã nascer".
O livro é precedido por uma bela apresentação de Paulo Bonfim,
o poeta dos paulistas, que, com
outra frase lapidar descreve o
conto como "o soneto da prosa".
Ada Pellegrini Grinover é membro da
Academia Paulista de Letras, professora
titular da Faculdade de Direito da USP;
escreveu, entre outros "A Menina e a
Guerra" (ed. Forense Universitária)
Dez Mulheres
Autor: Miguel Reale Jr.
Editora: Best Seller
Quanto: R$ 22 (144 págs.)
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