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CRÍTICA ENSAIO
Sevcenko cria estudo seminal sobre motim
"A Revolta da Vacina" narra manifestação contra o programa de saneamento do Rio no início do século 20
ANTONIO CELSO FERREIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Publicado originalmente
em 1983, na coleção "Tudo é
História" da Editora Brasiliense, o livro "A Revolta da
Vacina", do historiador Nicolau Sevcenko, alcançou, com
o passar dos anos e a crescente recepção do público, o estatuto de ensaio interpretativo seminal sobre um dos
mais emblemáticos motins
urbanos da história brasileira do século 20, ocorrido em
1904, no Rio de Janeiro.
É, portanto, oportuna e necessária esta reedição da
obra pela Cosac Naify, ainda
mais na série Ensainhos, que
reúne consagrados autores
desse gênero de textos.
O ensaio foi escrito como
desdobramento de uma pesquisa de maior abrangência
sobre a criação cultural de
Euclydes da Cunha e Lima
Barreto no quadro conflituoso que marcou a passagem
da monarquia para a república -da qual resultou a obra
"Literatura como Missão".
Em ambos os textos já se
salientava o estilo inconfundível do autor, caracterizado
tanto pelo manejo preciso e
elegante das palavras, quanto pela capacidade de extrair
significados das fontes históricas que vão muito além da
sua evidência formal.
Na obra ora reeditada,
Sevcenko lida com um episódio temporalmente limitado,
espontâneo, sinuoso e complexo em suas manifestações: a sublevação popular
contra a obrigatoriedade da
vacina antivaríola, imposta
pelo prefeito Pereira Passos e
pelo médico Oswaldo Cruz
como parte do programa de
saneamento e reforma urbana da capital federal.
EXCLUÍDOS
A decretação dessa medida deflagrou a revolta, que se
estendeu por dois meses em
batalhas aguerridas por toda
a cidade.
Os protagonistas do movimento foram os segmentos
socialmente excluídos ou
prejudicados pela política
econômica liberal do novo
regime encabeçado pela elite
civil paulista (população negra relegada à própria sorte
após a abolição da escravidão, pequenos comerciantes, funcionários públicos).
Duramente reprimido pela
polícia e pelo Exército, dele
restou um saldo de milhares
de mortos e encarcerados.
A história dessa tragédia,
narrada em tom de indignação que, todavia, não prejudica sua análise objetiva, é
exposta em quatro capítulos
nomeados, respectivamente,
com termos do vocabulário
dramático: ímpeto, angústia,
agonia e terror.
Nessa sequência o historiador desnuda magistralmente o cotidiano e os personagens da revolta, suas causas imediatas e estruturais.
Para a presente edição, o
autor acrescenta um posfácio em que revela as circunstâncias políticas da elaboração da obra: a transição da
ditadura militar para os primeiros governos civis na década de 1980, momento que
permitia estabelecer paralelos sugestivos com o início da
República.
Momento de sonhos, mas
também de desencantos,
igualmente marcado pelo
descaso com as classes populares, que de modo semelhante ao início do século,
anunciava, segundo o autor,
a "guinada sistemática para
o conservadorismo de uma
classe política retrógrada
que não admite mudanças,
muito menos sonhos".
ANTONIO CELSO FERREIRA é professor de
história da Unesp
A REVOLTA DA VACINA
AUTOR Nicolau Sevcenko
EDITORA Cosac Naify
QUANTO R$ 37 ( 144 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo
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